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A dedicatória

A dedicatória

Eis que surge, no insalubre ambiente de Zuckerberg, a informação de que havia as últimas unidades de um dado livro, direto na mão do autor. Corri para garantir o meu, porque quando algum amigo lança livro, eu quero o meu. Com dedicatória.

Sempre que eu ganho um livro, ou comprado direto na fonte, exijo dedicatória.

A melhor explicação para este meu desejo foi colocada em palavras pelo próprio autor do livro.

Antes de ir à explicação, ao livro, ao autor e à dedicatória, faz-se fundamental explicar algumas coisas. Tem gente que a gente não conhece assim de tanto tempo nem de tanto saber de pormenores, mas o santo bate. Alguma sinapse acontece, uma confusão dos seiscentos em impulsos nervosos, que concluem, só dando sinal: vale a pena.

Sobre dedicatória, escreve o mestre:

“Na verdade, o livro é apenas um ardil. O livro é qualquer livro. A dedicatória é que faz a diferença. Daí ninguém consegue ler mais nada, só a dedicatória. Uma hora dessa vou escrever um livro só com dedicatórias.”

É a dedicatória que faz um livro, seu.

Exige tempo, carinho, foco.

Quando recebo uma de um amigo que escreve algo como “obrigado por ter vindo”, ou pior “ao amigo, um abraço do (ou da)”, sinto uma certa decepção. Até o que faz o livro algo-seu virou pasteurizado, linha de produção.

Ora, mas quá!

Dedicatória, como o próprio nome implica, não aceita série nem código de barras. Ressente-se na frase feita, no que todo mundo faz.

Como dizer que é para mim, efetivamente, se apenas contempla platitudes aplicáveis ao próximo na fila?

Quem sou eu na fila do pão, quer dizer, na fila do lançamento e nos relacionamentos mais próximos do autor?

A compra de um livro de um amigo é, além do valor literário, a validação de uma amizade.

Do ponto de vista de quem assina, escrever um livro é, sobretudo, entregar-se ao outro. A história é feita para os outros, para o público. Escreve-se para que o mundo seja invadido pelas palavras do autor.

Já a dedicatória marca em GPS e grava a ferro quente sua localização e sua marca. Afirma, nos garranchos da primeira página que caiba, que dali para a frente o conteúdo pode ser para todos, mas ali, naquele trecho, a leitura tem valor no um a um. “Foi para você que escrevi tais linhas”, e a afeição se faz.

Como desgostar de um livro com uma dedicatória assim?

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Fiz o pedido e recebi a encomenda via sistema-de-entrega-em-mãos-aproveitando-a-viagem.

O livro: “Negô! Baêa!: A invenção da torcida baiana.”

O autor: o jornalista de profissão e de ensinamento, o homem sem sobrenome, de tanto nome que exige várias faces, Paulo Roberto Leandro.

Peço sua permissão e sua bênção para que esta dedicatória em poema tome vida para mais e mais tanta gente.

A ele, meu para sempre agradecimento.

“Ao querido sobrinho Gabriel

Um livro antigo – de papel
palavras coladas, frases, testamento,
pretensão de conhecer de um meio jumento
torcida-jornal, jornal-torcida…
Movimento intenso de vida

Não conhecemos nada! Que porre!
Só pressentimentos que algo ocorre
nada, nada e nada morre
nem uma dedicatória em põem
se faz sem sorte!
E é difícil sem corte!

O livro – de papel – segue antes do encontro
Fica o crédito do nosso almoço de sexta-feira
O sobrinho escreve muito e bem, fico besta!
Domador de palavras em indiana fila
E nunca rolou uma rima pobre ou farta
Vou ficando por aqui para não ficar mais feia carta,

O abraço,
A admiração,
O forte grito
No coração:

LAROIÊ!

A saga continua.

Do til Paulo”

***

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