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Bélgica e a incrível façanha de ganhar tudo sem mostrar nada

Bélgica e a incrível façanha de ganhar tudo sem mostrar nada

Januzaj, Bélgica, Inglaterra, Copa do Mundo, Rússia 2018, Kaliningrado

A “geração de ouro”. A melhor de todos os tempos do país. Times ricos se estapeando para contratar seus jogadores. Técnico tal dizendo que fulano é o melhor do mundo. Tanto fuzuê, tanta zoada, tanta lambeção que, olha, acreditemos que uma mentira dita mil vezes se torna verdade. No mundo da pós-verdade de agora, nem mil precisa, basta distribuir no Whatsapp que pronto!, é fato incontestável. Assim, na insistência, sem lastro, lenço ou documento, a Bélgica virou favorita a esta Copa do Mundo.

Viu-se navegando águas tranquilas e amenas num Grupo G que alocou Panamá e Tunísia para que brincassem de jogar bola, enquanto a tormenta era guardada para o último jogo contra a Inglaterra, valendo a liderança, ora, pois. E assim se fez. Lukaku virou artilheiro, Harry Kane ultrapassou. Tunísia até ofereceu certa resistência ao selecionado inglês, o Panamá até se protegeu por um tempo contra a Bélgica, mas sucumbiram, como havia de ser. Só que, mais a mais, os duelos contra os fracos africanos e caribenhos não querem dizer nada sobre a qualidade da equipe.

Veio, enfim, a partida final, tão aguardada. Era um tal de analytics pra cá, gráficos de regressão, coisa de supercomputadores, coisa pra ser adquirida por milhões de dólares e um real de BIG DATA. Até porque, valendo pontuação máxima na escala dilmarousseffiana de nada com nada, quem ganhasse perderia, e vice-versa. Isso porque, atestam, a chave de lá-além do Brasil é mais fácil que a de cá-com-a-gente. Isto posto, o segundinho pulava fora do caminho brasileiro, aninhando num mata-mata que só tem quase-chegas e a Espanha.

Com tanto número e planilha, especialistas que já traziam a expectativa desde antes: jogo previsivelmente chato. E não foi por falta de aviso. Roberto Martinez, técnico da Bélgica, declarou dando o tom da música. Às aspas: “Temos que competir bem, mas nossa prioridade não é vencer.”

Aqui se fala, aqui se faz. Não podemos dizer que falta palavra honrada ao técnico belga. E num grande gesto humano, seu companheiro inglês de profissão aceitou a oferta e arremedou o tal. Nessa leva, um saiu com 8 reservas, outro não se fez de rogado e tratou logo foi de botar 9 suplentes em campo.

Na base do desentrosamento fuleiro, era um tal de não querer jogar de um lado com uma preguiça do outro, um rame-rame lascado. Em vez de bola, batata quente. Fosse o estádio de Kaliningrado uma fábrica de linguiça, nunca seriam enchidas tantas nesta edição, exceto, talvez, naquele enfadonho França e Dinamarca.

Era, decerto, um jogo sofrido. Especialmente aos que pagaram ingresso. Depois da soneca e de checar as mídias sociais, a torcida vaiava, queria jogo. “Mas pra quê essa agonia, gente?” pensavam os atletas em campo, classificação garantida.

Só que aí veio o segundo tempo e o show de horrores teve o seu ponto alto. Aos 6 minutos, o belga Januzaj inaugurou o marcador para os vermelhos. Atleta que certamente terá sua desobediência punida severamente pelo líder. A prioridade não era aquela, afinal! Mas, mais do que isso, o destaque foi a comemoração maravilhosa do centroavante reserva Batshuayi. Depois do gol, talvez revoltado pela rebeldia sem causa do companheiro, pegou a bola para chutá-la violentamente dentro do gol. Errou o alvo – como provou ser esta sua principal qualidade, perder gols feitos, com selo Deivid de qualidade – meteu na trave, no que ela, a bola, já de saco cheio de tanta violência desmedida, voltou para dar-lhe um lindo soco na cara. Foi o que teve de melhor na pelada.

Não é nada, não é nada, não é nada mesmo. A Bélgica conseguiu a incrível façanha de ter a melhor campanha da primeira fase, mas esconder o jogo completamente. Jogou contra ninguém e quando contra alguém sacou o time todo. Assim, a dúvida permanece: Do que são capazes? Até onde podem chegar?

Difícil cravar. Certo, apenas, a minha torcida efusiva pela Colômbia contra a Inglaterra e a vontade gigantesca de ver a Bélgica cair nas quartas contra o Brasil. E se perguntarem a Martinez uma vez mais sobre sua equipe, poderá dizer, com ar de profexô, gato-mestre do nó tático, que se trata de “esconder o jogo pra enganar o adversário”. Problema será se enganar os seus próprios atletas, que são bola, mas que ainda não tiveram teste à altura de sua aura de favorita.

Batshuayi e seu momento

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