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Cada um tem a queda que merece

Cada um tem a queda que merece

Um vídeo varreu o Brasil essa semana. Nele, uma mulher que, debaixo de chuva e amparada pelo manobrista, tenta atravessar a correnteza que descia, potente, a Haddock Lobo, entre ela e a porta do afamado Paris 6. Depois do vídeo, espertinhos no mundo da propaganda que são os proprietários, prometeram acesso VIP e grátis à garota.

Rebobina 15 anos.

Era um dos meus primeiros anos na faculdade. Falho em recordar exatamente qual, mas vamos estabelecer como sendo o primeiro, porque não importa. Morávamos em Santana de Parnaíba, e minha rotina incluía sair de dia para procurar emprego e ter aula à noite.

Acordei particularmente cedo aquele dia, devia ter uma entrevista, ou algo do tipo. Provavelmente algo do tipo.

Descia nas primeiras horas do dia pelas íngremes ladeiras da cidade, ruins na ida, abomináveis na volta. Subir ladeira acima depois de um dia de trabalho e estudo é tarefa que não recomendo a ninguém. Eu me aproximava do terminal de ônibus da cidade. Devia ter umas, sem exagero, 15 mil pessoas ali esperando sua condução. Na esquina tem uma padaria, onde mais umas, sem exagero, 3 mil pessoas, comiam seus pães na chapa e tomavam seu suco de laranja antes de seguirem seus rumos.

No que caminhava, virei para trás, girando a cabeça para o lado esquerdo – estava na calçada do lado direito, portanto – para ver se tinha carro vindo, na intenção de atravessar. Olho para os dois lados, como papai e mamãe me ensinaram. Mas continuei andando e meu corpo seguiu prumo um pouco mais para a esquerda.

E…

E que a calçada acabou, pisei em falso no meio-fio e caí de cara na sarjeta, para apreciação e risadas dos milhares que ali testemunharam.

Na frente da padoca. Do lado do ponto de ônibus. 18 mil pessoas, sem exagero, na soma.

Mas veja como essa questão de jurisprudência e precedentes mudam a cabeça do homem. Depois do ocorrido desta semana, fiquei indignado! Então, não me ofereceram um misto. Nem sequer uma média. Muito menos tratamento VIP, que deveria ser um lugar no balcão onde o cotovelo não grudasse e o atendente do outro lado pudesse efetivamente me ver e me ouvir. Mas não. Necas. Nada, a não ser dedos apontados e galhofa.

Acho que todo mundo tem a queda e a recompensa que merece.

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