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Dia 2: En passant

Mucugê, 26 de janeiro de 2017

As belezas naturais da Chapada são conhecidas. Um colírio para os olhos. Pois muito bem: pode ficar melhor.

É de praxe: cruzar alguém na trilha significa cumprimentar. Bom dia, boa tarde, alguma indicação de cuidado se necessário, uma brincadeira ali e outra acolá, toca o barco. Questão de gentileza e educação. Hoje, uma família de argentinos e seu sotaque inconfundível me fizeram soltar um “Hola, que tal?” e um casal de franceses gastou todo meu vocabulário no “Bon jour!” na torcida para que não achassem que haveria mais. Não houve, ufa!

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Na saída do Centro de Visitantes do Parque Municipal de Mucugê, um grupo chega. Numeroso, umas 12 pessoas. Para cada um que passa, “Bom dia!”, porque é assim que tem que ser.

Eis que no meio surge uma mulher que deixaria quem não é chegado questionando sua vocação. Linda, lindíssima, lindérrima. Morena num jambo paixão natural arrebatador. Corpo escultural, cabelo com cachos, facilmente pelo menos 1,80 metro de altura, shortinho Gerasamba mostrando mais do que o recomendado pelos santos, um rosto que…

(Pausa para recuperar o fôlego)

Sabe Globoleza? Muito melhor, mesmo se você unir os melhores atributos de qualquer uma delas, de qualquer época. Saúdo um bom dia meio desconsertado; este tipo de situação não pode pegar de surpresa.

Nunca mais vou vê-la.

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Em Mucugê o pessoal sai a fazer sua caminhada e sua corrida na estrada. E você se surpreenderia com a quantidade de gente que veste seu tênis e sua roupa leve e sai a se exercitar no fim do dia. Temperatura amena, cuidado com a saúde, sabe como é.

Na volta a Mucugê depois do passeio no Poço Azul, gente indo e vindo. E lá vem ela, no sentido contrário.

Branquinha bronzeada de sol, cabelos lisos escuros presos num rabo de cavalo, um corpo delirante, olhos claros…

Sequer me viu, nem um boa-tarde, nada, nadinha.

Nunca mais vou vê-la.

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Elas existiram apenas naqueles instantes. Parcos segundos. Não saberei por fins e senões. Não vou conhecer o que as faz feliz. Não vou saber de seus intelectos, o que escutam, o que leem. Não poderei saber seus pecados, dos mais simples até os mais intransponíveis, como se declararem torcedoras do Bahia, por exemplo.

Nunca mais as verei.

Cumpriram seu papel na minha jornada. Se o barato da Chapada é ficar embasbacado com a beleza natural, por favor!, de agora em diante, exijo pacote completo, tal qual agora.

E me raciocino todo a pensar que a beleza passageira deva ser apreciada com ainda maior volúpia que a permanente, porque depois dali, meu amigo, vai saber quando outra surgirá a atrapalhar a compostura.

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