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Muito à frente de seu tempo

Muito à frente de seu tempo

Foram muitos os negócios que meu pai tentou empreender na vida. Editora. Livraria. E a Bolsa de Veículos.

Estamos falando do começo dos anos 90. Não existia internet. Não existia celular. Computador era negócio raro.

Ele sempre foi comercial. Vender é o ápice do convencimento, e nisso ele se refestelava. Trabalhou desde cedo em concessionárias de veículos, fez muitos contatos. De lá encontrou uma necessidade de mercado: saber preços médios de automóveis.

Foi o início da Bolsa de Veículos.

Juntava os preços dos veículos, mensalmente, e mandava para as concessionárias assinantes. Sabe a tabela de preços do Jornal da Tarde? Sabe a FIPE? Era exatamente o que vendia. As lojas, consequentemente, ajustavam seus preços, negociavam compras se baseando nas margens possíveis dado o preço final ali estipulado.

Com o tempo, evoluiu o negócio. Começou com 14 lojas, chegou a atingir centenas. Mais de 90% das revendedoras de veículos de Salvador e de Feira de Santana eram assinantes. Atingiu tanta gente assim quando passou a, além de mostrar o preço médio, a divulgar os estoques de cada uma das lojas semanalmente. De poucas páginas, passou a ter dezenas de páginas. Cada assinante tinha o espaço para divulgar o seu pátio. Mudou o software. Saiu a impressora matricial, entrou a impressora industrial para imprimir em papel enorme.

Grampeei muitas edições. Tudo feito no quarto de casa.

Sabe Webmotors? Era o que se propunha a fazer.

Para os comerciantes, mais uma vez, informação valiosa. Qual a margem praticada de preço para cada veículo? Que veículo “encalha”? Se eu tiver comprador prum carro que não tenho no pátio, quem tem, por qual preço e como posso partilhar comissão?

Era um negócio interessante. Mas para quem tivesse tino de administração.

No ano de 1995, mês de setembro, botou pra frente a Feira Baiana de Veículos. Juntou todos os assinantes e mais alguns outros no Parque de Exposições em Salvador. Muita gente. Apareceu até na TV, dando entrevista em bancada, reportagem no local. A maior parte dos revendedores saiu muito satisfeita. Um deles, na Vasco da Gama, que sempre tinha carro em baciada e eram mais caros, disse nunca ter vendido tanto. Veras Veículos, lembro bem do nome.

Quase todo mundo ganhou dinheiro. Menos meu pai. O tal do tino que não possuía.

Seis meses depois refez a Feira. Pensou ser a chance de corrigir os erros de arrecadação da versão anterior. Mas aí o fator descanso pesou: Salvador, naquela época, não comportava outro evento de tal porte em tão pouco tempo.

E o que era buraco virou poço. Foi o fim da Bolsa de Veículos e da vida em Salvador. Seguiu com minha mãe para recomeçar em Campo Grande logo na sequência, filhos foram apenas no fim do ano.

FIPE. Jornal do Carro. Webmotors.

Prefiro racionalizar que ele pensava muito à frente do seu tempo.

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