Mucugê, 24 de janeiro de 2017
Mucugê é das cidades centrais da Chapada Diamantina. Um dos hubs de deslocamento. Não tão grande quanto Lençóis, nem tão bucólica quanto Igatu. As ruas são de paralelepípedo disforme, que exige velocidade baixa. Asfalto apenas na estrada. Seu maior marco é o cemitério gótico bizantino, de fazer orgulho a Odorico Paraguaçu.
A cidade é rodeada de belezas naturais mil, que estão menos carregadas na água. Precisa chover por aqui. Na estrada, rios e corredeiras que costumam correr caudalosos, fiapam vazamentos que seriam interrompidos se uma pedra rolasse mais pra direita.
A igreja, a praça, a prefeitura, o banco, o boteco. Cidade de interior.
Pela rua descem quatro garotas, claramente não brasileiras, tanto em advérbio quanto em adjetivo. Uma delas se destaca: morena, mais alta e mais bela que as outras três. Não era grande coisa, mas tudo é uma questão de régua de comparação, as amigas lhe serviam de escada. Usam roupas simples, um vestidinho, um shortinho com camiseta, chinelos nos pés, cabelos encaracolados presos. Impossível saber o idioma que devem conversar. Eu, acolhido no ar-condicionado do carro, apenas consigo observar seus caminhares trôpegos e sem muita finalidade. No que, passando por mim, a destacada exibe um grandiosíssimo tufo de cabelos debaixo do braço.
Que desencanto!
Chegamos à casa que nos abrigará por algumas poucas noites. Nossa anfitriã mostra a casa e nos acompanha até o mercado para abastecer a despensa. No caminho, um mercadinho, o “Tem de Tudo”.
– E esse aqui, Lene?
– Esse aí não tem quase nada.
Propaganda enganosa, penso.
Depois um pulo na quitanda para comprar o que faltou. Umas cebolas, limões, uma manga para completar o 1 real da compra.
Na volta, a internet que ainda não funciona, o pacote diário de dados contratado da única empresa de telefonia que funciona por essas bandas acaba depois de enviar duas mensagens pelo WhatsApp. O wi-fi é que nem o Tem de Tudo: tem, mas não tem.
– Se der problema, pode ligar nesse telefone, diz o técnico.
– É o seu? Pergunto.
– Não, responde ele, já dando as costas.
Resigno-me. Penso que isso seja importante para absorver o que virá a partir de amanhã. Menos conexão on-line, mais conexão de outras origens.
Contato com a natureza, sabe como é?
Mas na prática, a teoria é outra.
Seria lindo, mas, porra, a internet: como é que se vive sem ela?
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