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Chimoca, o Milton e o Nilton

Chimoca, o Milton e o Nilton

Eram muitas as figuras diferentes que habitavam a vila. Dona Dina, a obesa mãe-de-santo que cuidava de todos e olhava pelos seus. Seu Zeca e Dona Mocinha, pais de Davizinho, donos das vendas. Seu Vavá, o médico da cidade. Bacurinha, que já foi retratado aqui e ali.

Das figuras mais interessantes era Chimoca.

Vivia com seu cavalo, e quando danava de chegar visita, saía menino pela vila a chamar Chimoca, que devia estar em algum bar, porque na cachaça a vida andava. Dali a mais um tempo, nada de Chimoca aparecer. Quando menos se esperava, já depois de hora e muita, ouvia-se os passos lentos de seu cavalo.

Ele estacionava na frente da casa e povo corria a ver pela janela. Ele descia, e perito em onomatopeias, iniciava seus relinchos, seus saltos, seus pocotós, e se olho fechasse, era o Minotauro, metade homem, metade cavalo.

Quem também teve sua fase em Mutá foi Milton Nascimento. O próprio. De fala pouca e sempre mansa, seu estilo era bem mutástico, por assim dizer. Passava o dia quieto, raramente puxava o violão e com menos raridade, mas ainda muito pouco, cantava.

Certo dia, vizinho foi ter na casa de Davizinho, que chegara de Salvador, mas não avisara. Irrompeu, já rindo, o portão, entrou na sala, e já chamando meia dúzia de sacana, descarado e sacripanta, desses benefícios que a intimidade proporciona, deu de cara com Bituca, sentadinho, quieto, no sofá. Percebendo a gafe, nada mais falou e saiu de ré pela porta, com o rabo entre as pernas.

Milton saía sempre a caminhar pelas praias e mangues, muitas vezes sozinho. Poucas vezes era parado, pelo desconhecido que era para a maioria, e pelo respeito que impunha, sem contar o medo da aproximação que sentiam os reles mortais.

De cócoras em frente ao mar, com a maré batendo suave em seus pés, mariscava devagar, olhando para o horizonte. Aproximou-se um menino, não devia ter mais do que 7 anos.

– O senhor é o Nilton Nascimento?

Nilton. Com N.

– Sou.

Disse ele rindo e fazendo um rápido cafuné na cabeça de seu companheiro, que ficou ali paradinho olhando para o horizonte, em cumplicidade contemplativa.

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