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Já aviso de antemão que nem por decreto, nem sob tortura, revelo os nomes verdadeiros dos que serão aqui retratados. História complicada, de um amor de uma noite. Para que sejam preservadas as identidades dos envolvidos, chamaremos nossos gloriosos personagens de João e Danilo.
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Eram muito amigos o João e o Danilo. Viviam grudados, principalmente nos bares da vila, a encher a cara. Danilo, este então enchia a lata demais. Dono de grande voz, sempre que aparecia alguém de violão, todos paravam para ouvi-lo cantar. Voz que encantava e garantia noitadas alegres.
Bela noite, beberam por demais. De ficar ruim. E enquanto cantava, João começou a olhar Danilo de maneira diferente. Era algo que nunca tinha sentido. Era estranho. Mas anestesiado pelo álcool foi sendo levado pela libido à flor da pele. Danilo, e foi aí que a porca torceu o rabo, mamado na pinga, não recusou os olhares chameguentos de João.
E nessa de olhar desejoso e olhar correspondido, se amaram por uma noite.
No dia seguinte, João acordou dolorido. Física e psicologicamente, se é que você me entende. Com o efeito da cachaça sumido, arrependimento chegou sem pedir licença e se instalou. Apostou no anonimato.
Coitado.
Se o fiofó de bêbado não tem dono – e isso ele tinha descoberto empiricamente –, a boca também não, e na noite anterior, depois de sua atividade, Danilo saiu distribuindo a notícia cidade afora, incluindo detalhes da passividade de seu parceiro.
Foi pisar o pé para fora e as risadinhas, os dedos apontados, e os comentários maledicentes invadiram a vida de João, que não conseguia lidar com tanta vergonha.
No começo, quando bebia, desabafava:
– Meu erro foi confiar nele! Ele disse que nunca ia contar para ninguém!
Só faltou dizer que amava.
Poucos anos depois, Danilo morreu, de cirrose. Hoje, ainda vivo, João percebe que todos evitam comentar sobre o ocorrido. Das duas, uma: ou respeitam sua dor e sua vergonha; ou então seguem na base do “vai que acontece comigo também”, e se calam.
Mas, ao mesmo, evitam esse negócio de contato visual com o vizinho. Se onde passa boi passa boiada, sabe como é, o precedente foi aberto, melhor evitar.
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