Um domingo de manhã qualquer, pode colocar uns 25 anos atrás. Talvez um sol entrando pela janela, aquele sol de manhã, que fazia brilhar a poeira no ar e avisava que o dia começava. Talvez esta imagem não tivesse efetivamente existido. Fato é que todo dia o sol levantava – e ainda insiste em seu ritual – e havíamos de cantar a ele.
Lembrança de cores, aromas, lugares, momentos, muito se esvaiu. Evanesceu. Ficaram os sons.
No toca-discos, dentre outros, ele à frente. Deixo-me raptar e ser levado a uma cama boa, captando uma mensagem à toa. Fino menino que sou, inclinava-me pro lado do sim, e seguia aonde suas palavras, em mim traduzidas, quisessem.
Abria-me a mente de infante. Instigava-me.
Tantas referências. Muhammad Ali. Bruce Lee. Claude Levi-Strauss. Paul Gauguin. Cole Porter. Djavan. Gal. Lessa. Olodum. Ilê Ayê. Ray Charles. Stevie Wonder. Muitos. Tantos.
Tantas referências. A Baía de Guanabara. O Barbalho. Santo Amaro. O Clube Bahiano de Tênis.
Era um desafio intelectual. Por que, entenda bem, desde moleque não aceitava não entender alguma coisa. E no auge de minha imaturidade e parca letra, era um belo de um alvo.
Revólver, sou coqueiro.
Inteligente no jeito de pongar no bonde.
O que parece construção, mas é ruína.
Gargalhadas e lágrimas.
Navegava de oceano a outro com maestria. Com o tempo, fui assimilando sua poesia.
Mais do que cantor, é poeta.
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria
Tenho mátria
E quero frátria
A lindeza do que simples. Do que pleno de significado. Do que cheio de história.
Devo a ele minha formação do que entendo por música e letra. De um jeito ou de outro, o que veio depois derivou de sua influência.
Manoel de Barros dizia que a poesia é a virtude do inútil. Nele, a virtude deve ter encontrado o auge no encontro com a música. Talvez a utilidade da poesia seja tão somente o belo.
E isto ele é.
É lindo.
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Caetano Veloso completou 74 anos no dia 07 de agosto. E ainda foi presentado com a participação na abertura dos Jogos Olímpicos. Uma demonstração para o mundo do significado de sua arte. Me causa um orgulho imenso de ser baiano compartilhar nascedouro com João Gilberto, Gilberto Gil, Dorival Caymmi, ele.
Axé, Caetano!
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Meu Caetano foi formado por música e letra. Celebrações como Sampa e Terra ficaram de fora, talvez reflexo do menino que as fez entender desde o nascedouro. Era ambicioso, ora, fazer o quê? No Deezer você pode seguir no link abaixo:
http://www.deezer.com/playlist/2009688766
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