Quando surgiu o Novo, escrevi um artigo afirmando que aquilo ali não tinha absolutamente nada de novo na política. Fui atacado pelos Novominions, que tinham, como todo imbecil, a certeza irrevogável de sua bondade infinita, de ser porta-voz da causa inquestionável, e, por isso, de ser a solução para os problemas do mundo.
Mas o Novo, ora, sempre teve o fedor das elites, o namastê do burguês-odara. Acreditar nessa artimanha, para mim ridícula, mas tenho de dar o braço a torcer que a tática dá certo para atrair muita gente que precisa de uma causa.
Logo, a “”””nova”””” política se tornou linha de frente do Bolsonarismo. Mais que o próprio PSL, que os partidos religiosos. O que fez começar a bugar a cabeça dessa gente.
Mas eles, ali, firmes.
“A única pauta do Congresso é econômica, por isso o Novo vota tanto a favor do governo”, me disse uma pessoa com a qual tenho o alívio de nunca mais interagir.
Bem, pandemia veio, e é absolutamente impossível aceitar a gestão deste desgoverno e de um governante com pulsão de morte à frente do país. Quem se dizia limpinho, “votou em João Amoedo“. Outros perderam a vergonha, como um conhecido que, lobista de empresas de saúde, está feliz da vida com os bônus polpudos, enriquecendo na morte do povo.
Pessoas morrem às centenas de milhares, vacinas não existem por culpa única do governo federal, nova licitação pra repor a cloroquina vencida, Petrobras depenada (quantos “escândalos de Pasadena” cabem apenas no que Bolsonaro fez com a estatal só ontem?), milicos se espalham como vermes nas entranhas do poder, inflação dispara, desemprego – e muita gente se escondendo no “e o PT? Nele eu não voto nunca mais” pra não admitir o tamanho da estupidez cometida. Uma coisa é reconhecer responsabilidade de coisinha menor, sem prejuízo; outra totalmente diferente é encarar a vergonha extrema de se alinhar ao indefensável e se manter ali, porque se este grupo desumano for reconhecido por todos como o esgoto da civilidade, logo, quem está com ele também o será. Já o é, na verdade. Mas, lembremos, o bolsonarista é antes de tudo um covarde. Tigrão na tela do computador ou celular, mas txutxuca quando o caldo entorna.
Foi nesse ambiente que Daniel S., o anabolizado deputado, preso múltiplas vezes, mas, né? “cidadão de bem” elevou ainda mais o tom. Abandonou a ameaça velada de golpe, como fizera Villas-Boas em 2018, e foi pra incitação pura de golpe e violência, incluindo ameaça de morte. Como bom bolsonarista, o fez por vídeo – lembremos, acima de tudo, um covarde.
Alexandre de Moraes ordenou sua prisão. STF a manteve.
Na cadeia, que mais parece seu quintal — convenhamos, quem foi preso o tempo que foi mesmo como policial militar está bem acostumado com a vida no cárcere; não deixa de ser um sinal de como ele se sente à vontade detrás das grades — se protege em outros policiais, dentro de uma corporação desmoronada pela corrupção e pelo alinhamento ideológico ao bolsonarismo golpista — Daniel é interlocutor político que traz as polícias, quaisquer que sejam, para ser o braço capilarizado de um golpe que está em curso. Acena no portão para apoiadores, tem 2 celulares na cela, “vou mostrar o que é o STF”. Tigrão. Mas na audiência de custódia, txutxuca, pede desculpas, diz que exagerou.
Antes de tudo, um covarde.
O Congresso manteve a prisão de Silveira, que deve ser cassado na sequência e lidar em definitivo com sucessivas acusações e condenações. “Bandido bom é bandido morto”, dizem a horda de cidadãos de bem (sic), mas não o querem morto, claro, porque não é todo bandido que querem morto, só aqueles que têm origem bem conhecida — essa mesma que um ente nefasto como Ratinho defende ser exterminado. São os outros devem ser exterminados. De preferência, outros que sejam pretos, pobres, “sujos”. A tal da limpeza é profundamente racista, e vai aprofundando a semiótica da imundície.
Pois entre os raros votos na Câmara para libertar o bandido carioca de extensa ficha corrida, quem saiu em peso para tentar livrá-lo?
Ele mesmo: o PARTIDO NOVO. Única bancada a ter todos os seus deputados votando a favor do milicano.
O argumento agora é “liberdade de expressão”. Não vou entrar no mérito da questão jurídica — tem gente muito importante que afirma categoricamente tanto contra quanto a favor –, mas, ei, 11 a 0 na mais alta corte do país é coisa demais. Nem um mísero voto contrário à ordem de Moraes. Ninguém.
E assim, o Novo vai inventando mentiras para justificar um apoio incondicional ao bolsonarismo. Antes era a pauta econômica. Neste momento, é a liberdade de expressão. Depois, será qualquer coisa.
Mas seguirão eles ali, firmes. Abraçando o bolsonarismo sem jamais soltar. Porque para quem veio acumulando toda sorte de privilégios, limpeza étnica é desejo incontido.
Novo? Sai pra lá que eu sei bem o que é isso.
E até desses aí eu duvido terem votado no Amoedo.
Artigo publicado Papo de Galo_ revista #12, de 26 de fevereiro de 2021, páginas 22 a 25.
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