No terreno da casa de meu avô no Buraco da Gia morava Aloísio. Era das figuras mais diferentes que me cruzaram o caminho. E olhe que eu era menino pequeno. Ele morava na casa com Tia Gracinha, sua irmã, e Iaiá, a matriarca, minha bisavó.
Iaiá vivia na janela, apoio a cabeça com as mãos, e dado o avançado da idade e a flacidez da pele, esta posição lhe garantia sempre um involuntário sorriso enorme no rosto. Seu posto na janela foi assumido por Aloísio, seu filho, que ficava a olhar o mundo passando sem muito interesse.
Aloísio vivia de bermuda e camisa de manga curta, a barba sempre por fazer. Na mão direita segurava uma espécie de cajado com um prego na ponta. Era uma questão funcional: várias vezes ao dia ele saía pela rua buscando bitucas de cigarro apagadas ainda com algum resto de fumo, espetava-as com seu pedaço de pau, guardava-as numa pochete que levava amarrada à cintura e voltava para casa para reconstituir um trago que valesse a pena.
Sempre fui muito próximo de seus filhos, meus primos, Uedson, Ricardinho e Tadeu. Várias foram as vezes que fui dormir na casa de Terezinha, sua ex-mulher com quem os 3 filhos moravam – e ainda hoje moram -, migrante de Arcoverde a Salvador, que tem sempre um café prontinho para ser passado, uma voz doce sempre pronta a encher de carinho quem chega. Sou doido por essa mulher.
Acima de tudo, e era o que importava, Aloísio era Bahia. Doente.
Era batata. Quando o Vitória ganhava, seguíamos para a casa de meu avô. E antes de dar um beijo no careço, um chamego em minha avó, a gente descia para a casa dele. Algumas vezes, já prevendo a pirraça que logo mais chegaria, Aloísio fugia para a rua. “Porra, lá vem Paulo Galo”, ele avisava a quem estivesse por perto, e tocava para onde não pudéssemos encontrá-lo. Mas eram poucas as vezes que ele lembrava de fazer isso. Na maioria das vezes, ele ficava na janela, olhando para dentro de casa, absorto, perdido. Distraído.
A gente chegava matreiro. E já do seu lado da janela, meu pai dava um tapa no seu ombro, já gritando:
– Viu, sacana?
No susto, Aloísio dava um pulo da cadeira quase caindo no chão, soltava um palavrão e começava a resmungar sem parar. Ele não aprendia, dava trela para a pirraça, e meu pai se esbaldava, sarcástico, apertando cada vez mais a mente de meu tio, até Aloísio se retar de vez e se recolher a seu quarto, “porra, só vem aqui pra me encher o saco!”, e finalmente podermos dar alôs à família.
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