Bolsonaro não formaliza apoios estaduais. E nem deve. Seu jogo é de conchavo nos bastidores e manutenção de uma pretensa e propagandeada independência nos palcos.
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Os ventos do favoritismo dentro da política provocam sérios realinhamentos de apoios e propostas de parceria. Os comedidos de antes se tornam os entusiastas de depois, tentando surfar na popularidade que o nome do líder pode transferir para o candidato-parasita. Assim, Jair Bolsonaro elegeu uma enorme bancada para o até então inexpressivo PSL, que passou, por exemplo, de 8 para 52 deputados federais. Além disso, diversos governadores foram alçados ao segundo turno colados no ex-Capitão mesmo sem fazer parte de sua coligação, caso de Wilson Witzel (PSC-RJ) e Romeu Zema (Novo-MG).
Ou seja: colar em Bolsonaro no primeiro turno deu certo.
O segundo turno, no entanto é outro cenário. E, mais do que isso, Bolsonaro não está disposto a retribuir os apoios estaduais que tem recebido. O maior exemplo disto é em São Paulo. João Dória (PSDB) parece estar desesperado para emplacar o voto ‘BolsoDória’. O presidenciável, no entanto, agradece, mas não declara seu voto. Para piorar, a entrada do PRTB do folclórico Levy Fidelix e do vice Mourão provoca mal-estar na campanha.
Afinal, por quê Bolsonaro parece estar à margem das votações estaduais?
São três as questões a serem colocadas. E elas envolvem não precisar dos apoios estaduais, alinhamento ideológico e ressentimento.
NECESSIDADE DE PALANQUE E APOIOS ESTADUAIS
Primeiramente, Bolsonaro não precisa de qualquer palanque estadual. Sua vitória está garantida e ele será o próximo ocupante do Palácio do Planalto. Portanto, os eventuais governadores precisam mais de seu apoio que o contrário. Ao se manter afastado, Bolsonaro também evita que deslizes de administrações e currículos estaduais respinguem em sua candidatura. Hoje o presidenciável joga parado, com o regulamento debaixo do braço. Melhor evitar que haja contaminação desnecessária. Ainda assim, se aproveitando da popularidade de Bolsonaro, Witzel e Zema devem ser eleitos governadores em seus estados.
COERÊNCIA DO DISCURSO
Um segundo quesito se refere à questão ideológica. A comunicação da campanha de Bolsonaro sempre se pautou por ser alguém de fora do establishment de Brasília (o que quer que isso efetivamente seja), um forasteiro (mesmo que esteja há 29 anos como político de carreira). Seu discurso sempre foi o de alguém que não abre negociata com centrões e aproveitadores da máquina púbica – embora ele mesmo o seja. Assim, um apoio contundente no âmbito estadual macularia esta posição, pois o que estaria fazendo era justamente construir alianças com o ‘tudo-que-está-aí’, a que sempre se disse contra. Não tenha dúvidas, no entanto: tivesse ele a necessidade do palanque, ao contrário do que diz o primeiro item, estaria feliz declarando apoios estaduais e jogando por terra o discurso de “nós sozinhos contra todo mundo”.
RESSENTIMENTO
O terceiro item é o ressentimento dele e de toda a sua equipe. Desde o início da campanha permaneceram isolados. Ninguém queria vincular sua imagem à do Presidenciável, tido como instável e que poderia comprometer campanhas. Não acreditaram, portanto, nem no poder e alcance de sua candidatura. E, agora, nem na efetividade de sua futura administração. (Os partidos que sempre são base aliada ainda não embarcaram. Sinal ruim para ele, que aparenta enfrentar dificuldades de negociação. Estão ainda os partidos do Centrão “esperando para ver”.)
Desta forma, cresceu um ressentimento enorme no núcleo bolsonarista, a partir do entendimento que os apoios estaduais são meramente interesseiros (e obviamente são, especialmente o de Dória). E o comitê de central do deputado se refestela na volta por cima ao desprezar quem os desprezou. Para as câmeras, agradecem o suporte, mas em off, sobra soberba. É um meme em forma de postura política: “Quem não me quis deputado falastrão, não me queira presidente da República.”
ACERTO DE ESTRATÉGIA
Está certo, portanto, e independentemente do motivo, o presidenciável ao se manter afastado. Seu jogo é de conchavos nos bastidores e manutenção de uma pretensa e propagandeada independência no palco. Ele precisa abrir o diálogo e concessões ao Centrão para conseguir governar. Enquanto este momento não chega (ou não se divulga), assistiremos a movimentos um tanto patéticos de gente implorando por seu apoio, mesmo que não tivessem existido vínculos quaisquer até então.
Este é o terceiro artigo de uma série de ensaios e análises sobre política e estas eleições que se aproximam de seu desfecho.
Parte 2 (17/out): Por quê Bolsonaro está eleito
Parte 1 (16/out): Debater política é baixar o tom de voz