Quando o cruzamento saiu meio errado, atrás dele, que já se posicionava mais à frente para o arremate, parecia que o lance tinha acabado. Restava, talvez, ajeitar para quem vinha de trás, ou então deixar a pelota passar. As opções disponíveis para os comuns eram poucas e nada excitantes. Mas o mundo dos comuns não é casa dos que residem no panteão dos maiores da história. No impossível, a concorrência é menor (alô, Walt Disney).
Goste você ou não, queira você ou não, passou da hora de aceitar Cristiano Ronaldo é gigante. Os números falam por si. Maior artilheiro da história do Real Madri e da Liga dos Campeões. Consistente, vem numa sequência impressionante desde a virada do ano, com média que ultrapassa com folga 1 gol por partida. Aliás, sua média pelo maior vencedor da Europa supera a marca de 1 gol por jogo.
É possível entender a birra que muitos insistem em manter contra ele. Ele não possui a plasticidade que enaltece Messi, por exemplo (além do não compactuar do silêncio reservado do argentino). Sua técnica é apurada a partir de seu óbvio dom, mas com muito treino e aperfeiçoamento. Além do mais, é vaidoso em excesso. É boa pinta. E, pecado!, é sabedor de sua capacidade e externa sem rodeios seus objetivos. Cristiano Ronaldo é dono de sua narrativa.
Nesta última frase mora a raiva contra Cristiano Ronaldo. De maneira geral, o mundo não aceita aqueles que verbalizam suas metas. “Coisa de gente arrogante, prepotente” pensa a pessoa cheia de inveja escorrendo pelo canto da boca. O que essas pessoas preferem não olhar é que existe um profissional que além de talentoso, é trabalhador assíduo e focado. Não raramente apontado como o jogador mais esforçado do grupo por colegas de elenco.
Ora, como é que nós, comuns, podemos aceitar que um cara além de ter talento, de ser esforçado, de ser bonitão e de ser incrivelmente bem sucedido, ele também seja senhor de si?
A partir do momento em que ele se diz o melhor, que ele diz “estar ali”, o que resta ao resto? Numa época em que o legal é ser do contra e causar polêmica, como é que se vai concordar com esse cara? Qualquer elogio vai parecer repetição e inflar o já superestimado ego do portuga… Aí é que está: quando afirma e reafirma ser o melhor (e, no momento, é), Ronaldo deixa apenas duas possibilidades. Por um lado, ou se nega sua superioridade com birra e manha de criança mimada. Por outro, então há de se render aos seus pés, ó, meros mortais.
Afirmo: hemos de nos render. Não tem como, é uma luta perdida.
Porque quando se pula de costas para o gol, pé direito numa altura impressionante acertando em cheio a bola que vai no contrapé de um dos maiores goleiros de todos os tempos, na casa do adversário!, só resta aplaudir – e no caso de muitos, como o meu, soltar um palavrão estupefato na hora do golaço de bicicleta. E foi o que fez a fanática torcida da Juventus. Aplaudiu de pé, no que Cristiano Ronaldo agradeceu.
Este gol assinaria Leônidas. Do além-vida, chegaria perto da orelha do gajo, sussurraria manso: quando eu inventei a bicicleta, meu sonho era que ela saísse desse jeito.
É para momentos como esse que vive o futebol. Pelo belo, pelo plástico, pelo inesperado. Pelo “futilbol”, como propaga sabiamente o mestre Paulo Leandro. Pelo golaço de quem reina quase absoluto nos gramados mundiais e que, como bom vinho, deixou o melhor de sua trajetória para a maturidade. E se antes muitos diziam “sou grato pelo privilégio de poder ver Messi jogar”, melhor abrir espaço para mais um sujeito nesta frase.
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https://www.youtube.com/watch?v=3jmw9vLK4I4
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