Está na própria estrutura de esportes de competição. Alguém é sempre declarado campeão. Eventualmente, pode haver empate nos esportes individuais. Mas nos esportes coletivos, embora o empate seja permitido ocasionalmente, um campeonato tem, no campo de jogo, apenas um campeão, apenas um troféu. O que torna o empate um elemento absolutamente intruso no decorrer de uma competição. É um acinte.
Na Premier League britânica, as primeiras três rodadas tiveram apenas três empates. Já no Brasil, a covardia de não buscar a vitória se tornou a praxe. Arriscar vencer é, pois, arriscar perder, embora que a razão indique que uma vitória e duas derrotas vale mais três empates.
Mas vai além. Time que abre o placar se retrai para segurar a vantagem mínima, como se inconscientemente chamando o adversário a marcar. “Venha, não sou merecedor do sobressalto.”
Justificativas fáceis
A retórica da justificativa dos empates em profusão se baseia em argumentos tão esdrúxulos quanto inacreditáveis. ‘Veja bem’ é a tônica. “O time está invicto!” “Um ponto fora de casa vale ouro.” “Foi um ponto dentro de casa contra um adversário em crescimento.” “O juiz prejudicou.” “O time não correspondeu ao que foi treinado.” “Falhas individuais.” “O elenco é mal montado.”
Deixem-se os contextos de lado. O que vale é a fácil resposta pronta, que demonstra tão somente fraqueza de trabalho e de caráter. Esqueçam-se as critérios comparativos de trajetória, condições de competição, peso da camisa, dia de semana, tempo de descanso, quantidade de jogos disputados, crise financeira. Finjamos que o adversário não passa pelos mesmo critério.
Quem quer o empate?
A ânsia pelo empate, este subterfúgio nefasto de exposição dos sem-vontade, revela a realidade estagnada. É o domínio do assim está bom, da resignação, do nhé insípido, inodoro e desvalido. O empate é um prêmio de participação, um joinha pra café-com-leite.
Sobretudo, esta preguiça por algo mais desestrutura a paixão do torcedor. Ao observar em ação a inércia do “já está acabando?”, o aficionado se pergunta o que estão a fazer os desvirtuadores do manto. Que sentido tem esse tal de futebol se o pouco é suficiente, se o meio da tabela é o que dá, enquanto se mentem objetivos de glória?
Mas insiste-se no veja bem: (insira aquela desculpa que você está cansado de ouvir)
Ambição é o mínimo
Aos fatos. Aceita-se a incompetência, embora alguns dela abusem e ainda assim saiam titulares na centroavância. Aceita-se a desorganização tática, especialmente quando parece que tudo no futebol se resume a saída apoiada e linhas desenhadas em prints de tela. Aceitam-se até insuficiências cognitivas, esta avaliação subjetiva que é a face do desdém. O que não se deve aceitar, em hipótese nenhuma, é a falta de brio e de ambição.
Se para o torcedor, o seu time é o melhor do mundo, cabe à agremiação primariamente buscar demonstrar este querer, esta gana de assumir o seu devido posto. O que vem depois é qualificação daquilo que é imutável: a paixão tem que estar espelhada dentro de campo, caso contrário, a essência do esporte está sob ataque. Time que joga na base do veja bem, que adota o empate como filosofia de trabalho, além de afastar seu torcedor, opera para esconder suas muitas outras incompetências.
Claro, em algumas ocasiões, o empate pode ser um bom resultado. Mas sabe o que é sempre um bom resultado? A vitória. É a ela que o jogo se direciona. É ela que se deve ambicionar.
Gabriel Galo é escritor
Artigo publicado na edição impressa e no site do Correio da Bahia em 05 de outubro de 2020. Link AQUI!
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