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A fábrica de inimigos

A fábrica de inimigos

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Os ataques de Eduardo Bolsonaro à China servem a 2 propósitos. Um deles é perpetuar o seu proselitismo político, reativando a fábrica de inimigos.

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Nesta quinta-feira, Eduardo Bolsonaro compartilhou em suas redes sociais mensagens que chamam o coronavírus de vírus chinês. Trata-se de ação orquestrada, mas de riscos assombrosos e demonstra, mais uma vez, que a radicalização é o caminho que decidiram seguir.

O que os Bolsonaros estão fazendo ao acionar a horda MAV pra vender a narrativa anti-China serve a 2 propósitos: obedecer às ordens que vieram dos EUA e perpetuar o seu proselitismo político, fabricando um inimigo imaginário, neste caso, a China e o “comunismo“.

A trajetória da família na política se baseia no estímulo à dissidência, à não convivência, ao confronto. Eles não sabem operar em tempos de paz. Por isso, insistem tanto em provocar crises, para exaltar ânimos e deixar viva a mensagem de “estamos combatendo um inimigo poderoso”. Seus apoiadores, hoje quase restrito a um olavismo tacanho (há outro olavismo que não seja obrigatoriamente tosco?), compram a contação de estória e a absorvem como verdade, carentes que são de que inimigos estejam debaixo da cama e só eles, os “inteligentes”, conseguem ver.

Só que isso como discurso eleitoreiro, pode até funcionar, como funcionou em 2018, ao pintar qualquer discordância a Bolsonaro como “comunismo”. Outra coisa, no entanto, é ser governo.

Não é necessariamente novidade. Na Itália, a extrema-direita teve incursão rapidíssima no poder e está sendo defenestrada. Na Hungria, Orban, o modelo de Eduardo Bolsonaro, enfrenta uma oposição resistente e vai perdendo força, apesar de todas as maneiras de cerceamento de poder via educação (tal qual Weintraub), via censura e via cultura. Na Turquia progride o modelo mais autoritário, em que Erdogan partiu logo pro golpe militar e instaurou uma ditadura à sua maneira.

Uma vez em que você é governo, percebe que as nuances são muitas, os contratos são muitos. Você, como gestor temporário do Estado, tem que sentar para conversar com quem está do outro lado ideológico. Isso necessariamente exige diplomacia, cordialidade, alto nível de análise e pragmatismo. Tudo o que eles não têm.

Assim, chegaram a uma sinuca de bico. Dado isolamento de Bolsonaro nas pífias manifestações do dia 15, mais a perda significativa de apoio popular, mais o massacre de qualquer pessoa razoável, inclusive apoiadores fieis, às medidas retardadas contra o coronavírus, viram-se sem ter pra onde correr.

Então, o que fazer?

Infantis no tabuleiro de negociações internacionais, apostaram, mais uma vez, no improvável. Decidiram por se esconderem num conservadorismo à la USA (para saber o que os MAVs de cá vão falar, basta ver o discurso de Trump pouco antes. Foi lá que começou a se espalhar a ideia de vírus chinês), torcendo por uma contrapartida americana que, aliás, nunca veio. Com isso, toparam entrar numa briga comercial que não têm qualquer possibilidade de sustentar, justamente com o maior parceiro comercial do país, a China.

O Embaixador da China no Brasil e a Embaixada Chinesa elevaram o tom reagiram exigindo retratação.

Entra, pois, Ernesto Araújo. Exibindo seu total despreparo e incompetência, solta uma nota em que, na verdade, pede retratação chinesa ao Brasil e a Jair Bolsonaro, a quem chamou de Chefe de Estado, que nem sequer foi citado pelas mensagens chinesas. Eduardo Bolsonaro, então, fez nota oficial em que manteve o que falou e foi uma contradição ambulante. Diz, uma hora, que não quis ofender o povo chinês, mas criticar o governo chinês no embrião da crise. Depois, disse que não visava ferir o bom relacionamento entre os países. Em nenhum momento, pediu deculpas, como exigiu a Embaixada Chinesa.

Havia apenas duas possibilidades: ou a China recuava, ou avançava. E os chineses avançaram.

Numa série de 5 tuítes direcionados a Eduardo Bolsonaro, dão a entender que haverá uma ofensiva comercial da China contra o Brasil.

A curva de Bolsa e dólar, daqui pra frente, vai depender do que houver efetivamente de retaliação chinesa. Nas mensagens, leem-se elogios ao Presidente e ao Ministro da Saúde (diplomacia em ação), restringindo o embate ao 03. Isto indica que há menos chances ocorrer uma inserção em atrito comercial entre os países. Só que a brecha está aberta. Se houver algo nesta linha, em qualquer nível, podemos aguardar queda ainda maior do mercado de ações e subida pesada do dólar.

Mas tem muito mais.

O ano será de forte queda do PIB, com gente calculando até recessão de mais de 3%. O país já está travado no investimento público, seja via teto de gastos, seja via quebra do governo como estimulador da economia ao promover seguidas privatizações. Como importador de bens manufaturados fica à mercê do dólar. Ao mesmo tempo, baniu pesquisas para recuperar a curva de produtividade e desmantela a segurança macroeconômica ao corroer as reservas cambiais como arma única para frear a curva de desvalorização do Real.

O Brasil, com um pé na recessão, comprou uma guerra da qual deveria se afastar por completo. Porque os EUA são grandes demais, a conversa com a China é em pé de igualdade. Mas o Brasil é periférico, não tem soja que segure a realidade de que, na conversa entre adultos, os EUA vão trair a inexplicável confiança bolsonarista e deixar o país à mercê da vontade oriental.

O cenário é absolutamente caótico.

Impressiona como este governo consegue fazer tudo errado. Todos os movimentos estratégicos recentes são tiros no pé, que minam apoio e derrubam o país num buraco mais fundo, de saída mais complexa. E na sanha de recuperar um inimigo para reanimar a base que perde voz, não faz ideia de onde está se metendo.

A crise é de proporções ainda maiores com Bolsonaro no poder.

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