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Fernanda

Fernanda

Arthur, Fernanda e Gabriel.

Levantar, sacodir a poeira e dar a volta por cima. Os dramas de recuperação da vida podem ser divididos em duas categorias: os que nos são impostas por terceiros, sobre as quais não exercemos qualquer controle; e os que nos infligimos. Dentro destas duas castas, a primeira oferece um pacote completo de vitimização, de que o universo conspira contra nós; a segunda, por outro lado é dura e potencialmente destruidora. Afinal, somos algozes e vítimas ao mesmo tempo. Temos ninguém a culpar a não ser a nós mesmos. A dor de decisões questionáveis persegue e nos fazem ter o passado sempre como horizonte, repetindo erros na esperança de que fazer novamente subitamente se transforme em correto, e tudo aquilo que causava desassossego é transformado em coisa certa desde a largada.

No que tenho para mim que pôr-se de pé por conta própria devido a autopenitencias é ainda mais duro. Amar-se depois de ver-se como vilão de sua própria história requer força descomunal. Coisa de mulher maravilha.

Esta é minha irmã. A Mulé Maravilha.

No estereótipo criado da virtude irrevogável, temos personagens de índole imaculada, que lutam contra o mundo enquanto o mundo luta contra elas. Este tipo aí é para consumo externo, coisa de marketing de quinta categoria, que vende o impossível fantasiado de factível, como se comum fosse. Só que minha irmã não é assim e, por isso, é bem mais.

As verdadeiras mulheres maravilhas brasileiras carregam nos ombros a dureza de uma vida sacrificante e sacrificada. Levam nas costas os filhos para criar, praticamente sozinhas. Lutam em empregos que podem não oferecer o futuro mas garantem o presente, a comida na mesa, o teto sobre a cabeça, cama para dormir e água quente. Raros são os casos das que conseguem deixar para trás aquilo de que não se orgulha e elevar-se à frente com leveza.

Hoje, ela, apesar das recaídas de humor vez ou outra – dirão ser coisa do sangue da família – caminha com sorriso no rosto, fazendo o melhor que pode. Balança de um lado os 3 filhos, do outro a casa para cuidar, do outro o marido que pode finalmente chamar de companheiro, em mais outro lado vários trabalhos para assegurarem os caraminguás de que precisam.

Muita água passou por debaixo dessa ponte. Muita, bicho. Enxurradas que derrubaram a ponte muitas vezes, que ia sendo constantemente reconstruída. Por vezes de madeira leve que se caía quase que instantaneamente. Na solidez variável das construções e reconstruções pela vida, a ponte de agora é sólida e perene. Pode vir enxurrada, tsunami, raios, trovões, bombas e bocas malditas. Permanecerá ela lá no alto, de pé, com suas cicatrizes expostas, orgulhosa de si.

E eu observarei sempre daqui de baixo, admirado, cheio de orgulho de ver a mulher em que ela se tornou.

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Minha irmã completa hoje, neste 21 de janeiro de 2018, 32 anos. Feliz aniversário, besta-irmã!

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