No primeiro toque na bola, quando a apito trilou, a hora chegou. Porque, caro torcedor, o que vimos até agora era preliminar. Campeonato Baiano, então, está mais para aquecimento que jogo oficial. O soar do sinal indicava o fim do recreio, hora de ir para a aula. Hora de separar homens de meninos.
Quem somos nós na fila do pão?
As dúvidas se instalavam nas mentes apertadas de todos espalhados pela Bahia e rincões onde embaixadores são nomeados para representar suas cores. Afinal e ao final, contra os bichos-papões de ali adiante ao sul, o que vale é a atitude demonstrada, a bravura da honra defendida. “Este é meu pedaço!” bradado no ritmo da brocação incessante.
No que a mentira do mundo do intervalo pode ofuscar a realidade. Pode cegar para o fato de que o rei está nu. Ou, talvez, que, já sem forças, está natimorto e deve ser reposto.
No ludopédio brasileiro, a clareza do sucesso é somente possível pela permanência. Na beliscada de uma vaga para competições internacionais. Se para trás não se anda nem para pegar impulso, para baixo nem para buscar ouro. Vade retro, segundinha, que eu não lhe pertenço e quero distância!
Ambição, no entanto, é privilégio. Ambiciona mais aquele que está acostumado com o gosto doce da vitória, nem que seja necessário desamarrar lembranças de um passado perdido na distância.
Mas este domingo não era dia qualquer. Era Dia das Mães. A conexão com o passado estava estabelecida, o portal para a infância estava aberto.
Mãe é máquina do tempo. É elemento que nos transporta automaticamente para o tempo em que contávamos a nossa nos dedos das mãos. No colo e no dengo de mãe, somos todos filhos.
Assim, ambos tomaram assento no túnel do tempo.
A máquina tricolor embarcou na viagem para 1988. Pediram conselhos de cabeça baixa em reverência e humildade, desentocaram as manhas de Bobôs e Charles, trouxeram para si seus passes e jogadas. Deram-se conta do legado a cumprir. Na velocidade de um contra-ataque do esquadrão de então, lembraram que, na Fonte, rubro-negro não se cria. Tratou foi logo de sapecar 6 para cima dos paranaenses de Libertadores, para lavar a alma maculada pelo domingo exatamente anterior. O Bahia olha para frente com gosto de sangue na boca, desejoso por glórias e querendo mais. Nordestão agora parece coisa de cumprir tabela.
Já o Vitória pegou avião para se fazer visita no Sul e carona na mesma máquina do tempo, mas foi parar no lugar errado. Bad trip. De Topper na camisa e Petkovic no time, foi parar no quando ao Leão pertencia o gigantismo regional. Embasbacados pela classe do gringo, foram acometidos pela arrogância de quem acha que recreio é prova final e pela tristeza de não se sentirem capazes. E na lerdeza de um caruru de domingo, viram o tempo passar sem muita vontade de mais ser.
O legado pode ser fardo ou pode ser motivação. Depende dos olhos de quem vê. Depende da ambição de quem assume seu manto. Depende se estamos enxergando com olhar de homens, que se abrem para o mundo para conquistá-lo, ou de meninos, munidos apenas de esperança.
Artigo sobre homens e meninos no Brasileirão 2017 foi publicado em 15 de maio de 2017 na versão impressa e no site do Correio da Bahia. Link aqui.
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