Atesto e dou fé. Registrou-se. Foi selado, carimbado avaliado e rotulado no Diário Oficial da Resenha Soteropolitana, publicado no boca a boca na última quarta-feira por volta das 17 horas de relógio. Definia-se que a próxima fase do hexa-que-virá cairia em pleno 2 de Julho, a verdadeira independência do vai, Brasil. E que, por consequência, ora, mas quá!, que era feriadão deste então até lá, sem interrupção.
No que o baiano aceitou a regra auto-legislada já preparando o isopor abastecido para todo o tempo. Na esteira do ponto facultativo transformado em feriado oficial, aproveitemos a licença para beber desde antes das 10 da manhã, para acordar sem despertador, para reunir a galera e torcer pelo Brasil.
Alguns sequer de despertador precisarão. Reunidos desde a véspera, nem conviverão com a culpa de comer uma água lascada desde cedo, porque nem pararam. Diz o lema dos torcedores fervorosos, cantado em repente e canto de arquibancada, “não precisa nem de mote / jogo em feriado só na base do virote”.
É benefício em demasia. Chuta-se a escanteio o banzo tradicional das noites de domingo, trocado pelo Olodum cantando de galo no raiar do dia.
Em vez de buzinadas no trânsito caótico, as vuvuzelas apitam seu berro rouco e sem tom. Cerveja e torresmo no café. Feijoada para secar a Bélgica. É dia de Brasil, pois, pois! Tudo o que sai é axé, é confluência astral, são bons fluidos.
Está no hino de nosso estado, este país chamado Bahia: “Nasce o sol a Dois de Julho, brilha mais que no primeiro. É sinal que nesse dia até o sol é brasileiro!” Não só ele. O sol é brasileiro, Deus é brasileiro, Neymar é brasileiro, Jesus – o Gabriel – é brasileiro.
E já que estamos falando de Bahia, berço efetivo do país e origem da vida – quem duvida é bairrista –, terra onde os absurdos já têm tantos precedentes que viraram o comum, chegamos a celebrar, aliviados, que o aeroporto não se chame mais 2 de Julho, para não dar sopa pro azar e parecer que o destino da Seleção nesta data seja um avião de volta pra casa. Ufa!
Para costurar um enredo que beirasse o fantástico, melhor seria se as bolinhas do sorteio hoje pudessem reservar Portugal em nosso caminho. Já pensou? Poesia demais. Cachoeira seria o centro energético do planeta. Tite vestiria roupa de armada, assinaria Maria Quitéria na coletiva.
Mas veio o México. Não importa. ‘Tá tendo Copa demais. Para nós, vale o clima de “já ganhou” que pegou a todos de jeito. Vale já pensar na Bélgica nas quartas, mesmo antes de um e de outro passarem pelas oitavas. A gente é torcedor, já projeta um 7×1 contra a Rússia na final como vingança de tabela. Vale baixar músicas de mariachi como trilha sonora pós-jogo. Vale Boneco de Olinda do Chaves na televisão. Vale pintar a rua de última hora, ficar rouco, abraçar o cunhado no gol. Vale o que vier, vale o que quiser. Vale tudo.
Vale especialmente a independência da realidade, cruzar a porta do armário que leva ao mundo da fantasia e viver ao máximo o espetáculo do futebol.
*Gabriel Galo é escritor
Artigo publicado na edição impressa e online do Correio da Bahia em 02 de Julho de 2018. Link AQUI!