Em Petrolina, na divisa de Pernambuco com a Bahia, Geraldo Alckmin se prepara para uma sessão de fotos e vídeos que alimentará sua campanha. O sol castiga num calor típico do sertão Nordestino. Vestido com camisa desalinhada com a calça sem ajuste, sua já não carismática figura sofre com os acessórios do figurino. Orna sua cabeça um caricato chapéu branco de vaqueiro, enquanto uma marmita de alumínio batida e desgastada lhe é entregue para construir o personagem de trabalhador sacrificado. A sessão conta com a sonoplastia do balido dos carneiros e ovelhas do sítio da Dona Marluce. Apesar do esforço, a sensação de incômodo impera. Nada ali está certo. E é um erro histórico do tucanato, que se prova seguidamente incapaz de dialogar com o Nordeste.
Nas últimas 4 eleições, os candidatos do PSDB à Presidência cometeram erros estratégicos gravíssimos. Em todos os casos, apresentaram uma incapacidade de se mostrarem autênticos e, mais impactante, uma vital incapacidade de se relacionar com o Nordeste. Não à toa, o local se tornou reduto petista.
Em 2002, a favela virtual apareceu na campanha de José Serra. Em 2010, foi a vez de nascer o “Serra comedor”. Em 2014, Aécio foi para os debates no segundo turno chamando Dilma Rousseff de leviana, que é ofensa pesada na região. Voltando a 2006, Alckmin alterou seu nome de guerra para Geraldo, tentou enaltecer suas raízes nordestinas, mas passou longe de convencer.
Trata-se, pois, de uma questão cultural. Enquanto o Sul e Sudeste adoram um tom professoral de fala, trabalhado pesadamente no Marketing e pautado pela apresentação de currículo (vide exemplos como o próprio Alckmin, Serra, Skaf, Dória e Haddad em SP), o Nordeste clama por reconhecimento e espontaneidade.
O reconhecimento vem da identificação no candidato de alguém que efetivamente representará o povo nordestino e não o deixará à míngua, como sempre foi feito na história do Brasil. Neste sentido, Lula foi o cúmulo da identificação: era ele, afinal, o Nordeste, o representante maior do povo nordestino. Já espontaneidade se refere ao trato, à fala, à comunicação, à forma, o que gera confiança e simpatia. É o tal carisma, praticamente inexistente em Alckmin. Este é um ponto crítico e que é oposto ao didatismo que vemos ao Sul. No Nordeste, as relações são mais pessoais que profissionais.
O tucano percebe esta dificuldade de relacionamento, potencializada pela ausência de palanques estaduais e admitida pelo secretário-geral do PSDB, Marcos Pestana. Assim, corretamente, identifica o Nordeste como alvo de sua comunicação e adiciona as mulheres, o grosso do eleitorado indeciso. Mas, como é de praxe no partido na era pós-FHC, falha miseravelmente.
Quando Alckmin veste um chapéu de vaqueiro, sob um sol de rachar, com feição de “me-tire-daqui” e vestimenta de senhor carola, cria-se uma figura caricata e um tanto ridícula. O cenário, com os carneiros e ovelhas a balir, é bucólico e um tanto surreal. O olhar aguçado não mente: tudo naquele vídeo está errado. O set, o tom de voz, o texto, a sequência, a roupa, a caracterização. Externa, em vez de empatia, uma pífia e inócua tentativa – além de um tanto preconceituosa – de se fazer “igual” ao sertanejo nordestino. Para fechar com chave de ouro a estapafúrdia incursão ao semi-árido, temos a foto com a marmita de alumínio, com olhar perdido no horizonte, imagem que oscila entre o cômico e o dó. Cordeiros de Marluce, tende piedade de Geraldo!
Sabidamente, a campanha do paulista à Presidência patina, ratificada pelas pesquisas de intenção de voto em que não decola. Ainda assim, aposta suas fichas na cobertura de televisão que começará daqui a alguns poucos dias. Não está de todo equivocado, pois há potencial para virar o jogo a partir do abuso do poder midiático que terá. Mas em uma eleição tão pulverizada, as estratégias de comunicação têm que se voltar ao nicho que leva determinado candidato ao segundo turno. Assim, Alckmin deveria concentrar forças no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Historicamente, a penetração do partido nestas regiões garantiria sua presença no segundo turno com certa tranquilidade.
A questão é balancear o foco sem ignorar o Nordeste. Este equilíbrio o PSDB não conhece. Até porque todas as suas interações com o local soam falsas. Assim, voltar deveria acontecer apenas quando o candidato sofresse um exaustivo e completo banho de loja e de postura. No mais, é imperativo aprender a lidar e a se comunicar com a região. Caso contrário, será apenas motivo de chacota e piadas. E, mais ainda, ajudará a consolidar a aversão e a rejeição que ele já tem muito altas.