– Por favor, um maço de cigarros, diz ele no balcão da padaria, logo cedo.
– Ué? Você fuma?, pergunta o amigo, espantado.
– Não.
– Qual, senhor?, pergunta o atendente, solícito.
– Qual o quê?
– Qual cigarro o senhor quer?
– Tá maluco? Eu nem fumo. Dá um rabo de galo, aí, vai.
– Arnesto, você só pode estar com problema! São sete e quinze da manhã!
– Senhor, não servimos bebidas antes das dez horas.
– Nem suco de laranja?
– Bebidas alcoólicas, senhor.
– Ah. Mas por que diabos eu beberia assim tão cedo? Estou indo trabalhar, rapaz! Faz mais de 15 dias que eu não chego bêbado ao escritório!
– Arnesto, você não trabalha.
– Como?
– Você foi demitido, Arnesto. Há duas semanas.
– E eu não sei disso? Por isso mesmo que falei que não chego bêbado ao escritório faz quinze dias!
– O senhor vai querer o suco de laranja?
– Ah, não gosto, me dá muita afta. Tenho gengiva sensíveis.
– Aiaiai, saiu o atendente, lamentando.
– Arnesto, está tudo bem?
– Claro que sim. Deixe-me pegar uns pãezinhos para levar para a Ofélia e as crianças.
– Quem?
– Ofélia, ora. Minha esposa. E meus meninos, Juca e Amanda.
– Quem?
– Não se faça de desentendido!
– Desentendido? Eu? Você nem é casado!
– Não?
– Não! E nem tem filhos!
– Não?
– Não!
– Que tristeza, gente. O que aconteceu com eles?
– Eles nunca existiram, Arnesto.
– Ora, Juvenal, me faça uma garapa. Eu não sou maluco!
– Juvenal? Eu não sou o Juvenal.
– Como não? Aliás, Juvenal, você pode me explicar por que está me chamando de Arnesto?
Silêncio.
– Garçon, dois rabos de galo, por favor!
– Senhores, nós não servimos bebidas antes das dez. Alcoólicas.
– Suco de laranja, então?, pergunta o Juvenal para o Arnesto.
– Vixe, melhor não, isso me dá uma afta desgraçada.
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