Em poucos dias, o caso Marielle re-emergiu para comprovar a incompetência e a sabotagem de todos os envolvidos e confirmar a morte do jornalismo investigativo brasileiro.
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Acabou. Morreu. Está na lápide: “Aqui jaz o jornalismo investigativo brasileiro. Foi morrendo aos poucos e ninguém percebeu.”
À exceção de alguns poucos como o The Intercept Brasil e do Ponte Jornalismo, quase todos sucumbiram.
O caso que liga o assassinato de Marielle Franco está absolutamente TODO errado. Em todas as suas frentes.
Existia um embate indireto de Marielle com as milícias. E tudo leva a crer que o incômodo que ela provocava gerou a sua morte, encomendada ao Escritório do Crime.
Sabe o Escritório do Crime? Aquele liderado por um ex capitão do BOPE, Adriano Magalhães da Nóbrega, cuja esposa e mãe eram funcionárias do Flavio Bolsonaro? O 01, o próprio? Então.
Vai e vem e desde o começo está tudo travado.
A polícia totalmente aparelhada por conta dos milicianos envolvidos, cria mentiras para isentar a cara dos culpados. Ainda assim, Elcio Queiroz e Ronnie Lessa foram presos. O desafio dos envolvidos agora é conseguir abafar o caso e deixar os 2 pagarem o pato sozinhos.
Os fuzis na casa de Ronnie Lessa: alguém sabe onde foram parar? E aquela centena outra contrabandeada que estava no Leme no apartamento do amigão (que foi, inclusive, solto), quem presta conta?
Tudo errado.
O MP designou para cuidar do caso a promotora Carmen Eliza Bastos de Carvalho, que bateu foto com camiseta do Bolsonaro durante as eleições e exaltou a vitória do presidente contra os “esquerdopatas”. Ainda por cima, a tal pessoa bate foto com o atual deputado estadual que aparece na foto quebrando a placa de Marielle. Que tipo de imparcialidade tem essa figura para atuar no processo?
E onde estava o PSOL, os advogados de Marielle, e todo mundo mais que não verificou este absurdo na origem do apontamento do nome da procuradora?
Estoura o caso do porteiro. Só que estava todo mundo avisado. Witzel avisou Bolsonaro, que procurou segurar, mas não conseguiu. (Talvez esteja aí a origem da raiva do presidente vista na live: um acordo descumprido para abafar o caso.) Cria-se, no decorrer, um embate com o interfone, tem álibi!, porteiro se enganou? porteiro mentiu?
Mas ninguém bateu no Vivendas da Barra para checar o sistema utilizado no condomínio. Ninguém entrevistou um morador, mesmo em anonimato, para saber qual o sistema usado, se ligam no celular para autorizar. Porque, estando Bolsonaro onde estivesse, se ligam no celular, ele pode liberar todo mundo. Mas não, e fica todo mundo “achando” por aí, e a coisa não evolui.
No mesmo dia, um presidente desequilibrado dá chilique em transmissão ao vivo pelo Facebook. Profere ameaças, se faz de vítima, pede atuação do seu ministro da justiça (deixa em caixa baixa mesmo). Só que a interferência do ex-juiz rompe o Estado Democrático de Direito. Mas, o que é mais um arroubo de desmoralização jurídica se eles não têm qualquer intenção de preservá-la?
Um filho, Carlos Bolsonaro, interfere nas “provas“, e todo mundo compra a versão. Algo que pode ser facilmente manipulado, por exemplo, mudando-se o nome do arquivo e pronto. Mas a “grande” imprensa, compradora de narrativas, nem questiona: o filho num vídeo qualquer, de um áudio sem qualquer periciamento legal, “comprova” o erro.
Antes, investigadores bateram no STF no dia 17 de outubro para alinhar com Dias Toffoli, o novo amor do governo. Queriam saber como proceder. Tinham, pois, evidências, que ligavam de alguma forma o nome do presidente ao caso, o que em si não significa culpa, mas demanda investigação.
Depois do impacto da matéria do JN e da convocação presidencial, Moro entra na jogada. Depois, miraculosamente, o porteiro “mentiu”. O livro de registro sumiu. Aras, PGR convocado para ser o engavetador de problemas criminais que batam no governo, se encarregou, mesmo estando num evento para procuradores no Rio de Janeiro, mesmo sem apreciar as provas e as argumentações, em prova de sua fidelidade, de arquivar o processo e pronto, “vamos mudar de assunto?”
Diz que houve competição para saber qual a melhor polícia do mundo. Soltavam um coelho na mata e quem trouxesse mais rápido, venceria. Primeiro foi a Scotland Yard, que com parcimônia, voltou com o coelho depois de 10 minutos. Depois foi a vez da Swat, que com equipamentos modernos, em menos de 5 minutos voltou com o coelho. Por último, a polícia do RJ, que voltou em 1 minuto com um porquinho na mão, que confessava, cheio de hematomas, “eu sou o coelho! eu sou o coelho!”
Não se trata mais, pois, apenas da investigação do caso Marielle. Tem muito mais coisa envolvida.
Tem a demonstração da morte do jornalismo investigativo.
Tem a inoperância dos advogados de Marielle para analisar nome a nome todos os servidores apontados na investigação e fazer checagem de parcialidade.
Tem a demonstração da morte da investigação policial em todos os níveis, que só um ano e meio depois colheu provas no condomínio diretamente ligado ao caso, provas estas fornecidas pelo filho de um dos possivelmente envolvidos – arrolado em declaração do porteiro. Investigação que, comprovadamente, está ali para blindar os mandantes.
Mas, no limite, existe um ataque ao Estado Democrático de Direito, que aparelhou todo o sistema para defender os interesses pessoais de quem se sente dono do estado. Com direito a entrevista do outro filho do projeto de líder supremo, Eduardo Bolsonaro, que ameaça a instauração de um novo AI-5.
Não coloquemos panos quentes: O plano é a Ditadura.
E o STF sem agir, assim como o TSE, a OAB, e a oposição. A imprensa se limitando a reverberar notas de assessoria. As ruas, sem voz. Todo mundo dizendo “nossa, que absurdo”, mas efetivamente fazendo nada.
Em poucos dias, o caso Marielle re-emergiu para comprovar a incompetência e a sabotagem de todos os envolvidos. E que a radicalização é a única alternativa para que os governantes de momento tomem posse de vez do Estado brasileiro.
A crise política — e consequentemente econômica e social — só tende a piorar.