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Salvador, 471 anos

Salvador, 471 anos

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Há 471 anos nascia essa cidade, cercada por corrupção da coroa portuguesa e que mudaria a história de um povo. Coisa que ficaria encrustrada no DNA do país.

Mas a velha cidade da Bahia tinha muito a oferecer. Cresceu sobre o colchão duro do separatismo, da pobreza, da elite tacanha que tudo quer para si, restando as migalhas ao povo que batalha e sobrevive.

E na sobrevivência, Salvador se reinventa. Porque, apesar das mazelas escancaradas, do limo sórdido de suas paredes como marcas de sofrimento na pele, vestem-se tantos de sorrisos no rosto a exaltarem um ideal de baianidade que é cantado em verso e prosa, transformando-a no melhor país do mundo.

Se o Brasil se diz uma terra abençoada por Deus e bonita por matureza, é porque nasceu em águas baianas e se estabeleceu em ponta soteropolitana, abrindo a Baía de Todos os Santos, todos, de uma fé a todas, como se chamando o sincretismo a fazer-se seu em sua festa, em sua agonia, em seu esplendor.

Li nalgum lugar que Salvador faz 471 anos com corpinho de 300. Engraçado como essa frase extrapola o significado pretendido e se torna síntese fiel de sua história.

Ao contrário do que a parábola física apregoa, cidade que evolui é aquela que tem aparência maior do que calendários dobrados. Ter tantos anos a menos remete aos tempos que ainda não se foram, da Salvador de lá e de cá, da que arrota escargot em mansões e da que se abarrota no transporte público, um tapa na cara de que a miséria é política pública e que a vida é dura.

Ainda assim, carrega um je ne sais quoi que encanta, um toque surrealista de sua gente que é inexplicável, senão apenas contada em histórias em que culhuda e verdade são rigorosamente a mesma coisa.

Nasci em Salvador, lá me criei e um dia pra lá voltarei. Se durante anos fui baiano não-praticante, reconectei-me com a querência de modo a dar-me conta de que foram, sobretudo, anos mais tristes pela distância. É de Salvador que eu vim, sim, senhor. É minha terra, é minha gente, é meu canto. Sou soteropolitano com orgulho, não apesar dos pesares, mas por causa deles.

E pra montar mistura que cria o melhor país do mundo, não pode faltar é desbaratino. De preferência, com muito dendê e banho de mar. Amar Salvador é aceitar o pacote completo.

Feliz aniversário, Salvador. Viver você todos os dias, mesmo de longe, é o que me torna mais humano.

Foto: Gabriel Galo / Acervo pessoal

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