A bucólica e belíssima Trindade, encravada na divisa do Rio de Janeiro com São Paulo, faz parte do Circuito da Marofa brasileiro. Aquele que possui São Tomé das Letras, todas as Chapadas e seus já sugestivos nomes, o Posto 9 de Ipanema e mais outros tantos centros espalhados por aí.
Nessa onda de marketing local, diz-se por aí que lá se faz morada de gnomos e duendes, que aparecem ocasionalmente para espantar os desavisados, aumentando a fama do lugar. Nesta linha seguiu um amigo, que jurando não ter sua mente alterada por nenhuma substância – claro, porque haveria de desconfiar? – veementemente afirma ter visto e ouvido um gnomo que num clarão surgiu na praia. Quanto mais sério ele falava, mais caíamos numa sonora e imparável gargalhada. Círculo vicioso, mais a gente ria, mais sério e bravo ele ficava – é verdade! – e mais a gente ria, e mais…
Na minha única experiência por aquelas bandas, fizemos check-in numa pousada. A diária, cara. A cama tinha peseira – dessas cabeceiras de pé – e eu, excedido na altura, dormi porcamente nas três noites, afinal, lá não cabia. E não ache você que por causa do preço elevado a pousada era dessas com conforto. Não, não, não… Ao entrarmos no banheiro, nos deparamos com o chuveiro sem box, sem cortina, apenas um rodo. Era o faça você mesmo levado às últimas consequências. Juro que fiquei ressabiado achando que o café-da-manhã incluso seria, na verdade, na mesma toada. Sentaríamos na mesa, alguém viria:
– A gente gostaria de um suco de laranja, um pão na chapa com manteiga, ovos mexidos e café.
A distinta pessoa sairia e voltaria com uma cesta contendo ovos, manteiga, pão, frigideira, laranjas na fruta e espremedor.
– Senhor, olha que boa notícia, o café já foi feito ali pela mesa do lado, se o senhor quiser é só ir lá pedir para eles. Táqui uma xícara. Bom proveito.
Na área da diminuta piscina havia uma placa: “Proibido surfar na piscina”. Porque, né?, claro.
Um pouco mais isolada do centrinho das praias de Trindade tem a praia do Cachadaço. Uma caminhada leve, cerca de meia hora, te leva a uma região um pouco mais isolada, bem menos gente. Assim como menos gente, menos estrutura. Na época então, há bons 10 anos, era nada que havia. Ou quase nada, exceção feita a uma barraca-quase-lanchonete. Pequena, cardápio limitado, mas para saciar a larica dos de olhos vermelhos, era um banquete.
Cansado e com fome, um amigo resolve passar por ali para comer algo. Não havia ninguém no local, a não ser um atendente pra lá de Bagdá, e este amigo meu. Nenhuma outra viva alma.
– Por favor, um pastel de queijo.
Pede, esperançoso, meu amigo.
– Claro.
E o atendente segue para dentro da cozinha. Dali poucos segundos ele retorna.
– Desculpa, você vai querer o quê mesmo?
Meu amigo olha meio desnorteado em volta. Não, não havia ninguém.
– Pastel de queijo.
E o glorioso atendente segue, uma segunda vez cozinha adentro, para retornar quase imediatamente.
– Cara, eu sei que você pediu um pastel, mas é de quê mesmo que você quer?
Perplexo, afinal, que complexidade há num pedido de um pastel de queijo?, ele responde com toda a calma que consegue reunir.
– Queijo. Pastel de queijo.
– Beleza!
E o atendente invade a cozinha uma terceira vez. Ao demorar-se um pouco mais, tem-se a impressão do sucesso da compreensão. Qual o quê. Volta o atendente com papel e caneta.
– Parceiro, fala de novo que agora eu anoto e não tem erro.
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