Não chega a ser uma gíria, mais está para um vício de linguagem. Na Bahia, fez sua morada. Assim como o “dia de”.
“Dia de sábado tem feijoada lá em Ninha”.
Mas isto é assunto para outro momento, mantenhamos o foco naquilo que vim aqui para falar.
E é isso que vou fazer, viu?
Aí está, este “viu” aí do final. Repare bem nele. Tão baiano quanto inútil, nesta construção de quatro palavras que os mais avessos à interpretação de texto não entenderão e cairão sobre minha cabeça como se eu dissesse que baiano é inútil. Não, senhor, não senhora. Inútil é o viu, viu?
Talvez não seja assim tão inútil, já duvido de mim mesmo. Trata-se de uma demanda por resposta. Que o receptor afirme ter compreendido o mensageiro.
Certo? Entendeu? Captou? Vive nessa linha, mas com muito mais charme.
Daí que o “viu”, nesta terra que come letras em palavras com a mesma avidez que a um acarajé, evoluiu. Em alguns locais, virou “vu”.
O “vu” carrega uma conotação um pouco chegada à indignação, ao inconformismo. Termina a frase ali com a fala perdendo o ar, quase sem sair, numa espécie de preguiça fonética que quase vira um “hum”.
“Te contar, vu?”
E tem a versão ainda mais indignada, nego retado como o que, que quer expressar sua inquietação. Normalmente, acompanhada de um muxoxo.
Mise-em-scène (receba, sacripanta, um francês recém-saído da Feira de São Joaquim, acabado de rabada e dobradinha, ajeitando chapéu e achando tudo lindo nesta terra que transpira dendê): Pense num baiano falando, meio retado. Não estes de novela da Globo, porque faz novecentos anos que a vênus platinada filma como se na Bahia estivesse e até hoje não teve um traste que lhe acertasse o sotaque. Este baiano é você. Retado, é importante. Sua cerveja veio quente, moqueca demorada da porra!, perdeu o buzu, chinela soltou a tira, nego se limpando de areia na praia e ela voando direto na sua porção de lambreta.
Viaje na viagem e solte:
“Aí é barril, vu, véi?”
Não esqueça do muxoxo! De novo.
“Aí é barril, vu, véi?” (muxoxo)
Pelo menos foi assim que eu sempre ouvi. Em sabendo que aquilo que aqui se escreve é baseado em percepção, tendo empiricamente testado em amostra única e alguns ouvintes da prosa eventual, confirmo ser, assim, que é.
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Ao telefone estávamos, no que alguém chega para entregar algo para Mainha, que se esquia na neve argentina, lá no fim austral do mundo. Mainha é baiana, claro, caso contrário estes prolegômenos todos não fariam o menor sentido.
Trabalha para ampliar o seu espanhol, fincou bandeira há pouco por lá. Nunca nem saída do Brasil, de repente parou num lugar oposto em clima ao seu de nascença, e ainda por cima cercada de argentinos. Pense.
Alguém à porta, um minutinho pedido ao filho. Vejo que está já arranhando umas palavritas, sobrevivência tem dessas coisas. Habla un poquito.
Ouço murmúrios, era o alguém dizendo a que ia. Ela capta e interage, de um jeito muito particular.
“Ah, tá. Gracias, viu?
Porque você pode até sair da Bahia, mas a Bahia não sai de você.
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