I’ve fallen in love.
I’ve fallen in love for the first time,
And this time I know it’s for real.
Assim cantarolava Freddy Mercury, do Queen, na emblemática “I want to break free”, música de melodia contagiante e clipe hipnotizante.
Botando ordem na tradução: eu me apaixonei pela primeira vez, e desta vez eu sei que é de verdade.
Moleque-menino, ingênuo das coisas da vida, não entendi. Seria um fino sarcasmo britânico? Ria da aparente contradição da fala, enquanto, mais fortemente, orgulhava-me de poder captar parte do inglês sem auxílio.
Demorou para que a maturidade impusesse juízo para compreender as artimanhas do amor, para absorver as complexidades das relações que entrelaçam corpos e destinos.
Que seria, pois, o amor?
A sensação angustiante de recém-adolescente que, diante da beleza da garota colega de escola, paralisava a mente e o corpo, fazia gaguejar e enrubescer o guri, dava a pista.
Punha-me, então, a consultar o oráculo do amor dos anos 90: os papéis de carta “Amar é” e ao interior das balas Ice Kiss.
Aos primeiros, pouco tinha acesso. Estava implícito na regra social que papel de carta era coisa de menina. Restava, pois, as balas, que além de oferecerem pílulas de sabedoria, levavam sabor e refrescância ao hálito da meninada.
Abria o papel para ler o textículo interno, tinta azul sobre o papel laminado cinza, deixando tatuagem impressa na bala, e era inundado de platitudes que pintavam o amor em bobeirices que, a bem da verdade, algum sentido faziam, e que moldavam o agir-correto perante a paixão.
Ali estava, portanto. Na repetição de atitudes pretensamente nobres, ensinava-se que amar é agir. Mas esta lição também foi assimilada muitos anos à frente.
Porque, no antanho da puberdade recém-instalada, ó!, decepção. Minha dúvida não era sobre o que fazer quando amar, mas entender se o que sentia era, afinal, amor!
O molde do comportamento, além do livro-texto em fascículos que vinha como troco na cantina, era a observação.
Olhava para dentro de casa e percebia que, se aquilo era amor, não era, por fim, algo assim tão nobre. Na TV, o amor era arrebatador, coisa de fugir junto rumo ao pôr-do-sol numa ilha deserta.
Entendo que a formação do amor, como conceito e como comportamento, é, logo, questão de convivência. Reproduzimos o que aprendemos. Somos repetidores de normas sociais, pois incapazes de avaliar se sim ou se não em julgamento de propriedade.
Este aprendizado, por óbvio, também veio com o tempo.
Na medida em que o eu-menino estirava, mais cores apareciam. Amava-se em muitos espectros, em muitas searas, em muitos cenários. Amar não era exclusividade do homem-mulher matrimonial, o que abriu a mente para abraçar o “eu te amo” à quem acalentasse o coração pela presença e pelo desejo necessário de dizê-lo.
O impulso de externar o amor contido era, finalmente, parte fundamental da montagem do quebra-cabeças do que é o amor.
Amar passou a ser a construção do sentimento que leva à descrição única, instintiva, em três palavras mágicas, quando todas as outras não parecem ser suficientes, numa catarse de entrega, no ápice da vulnerabilidade: eu te amo.
Conclui-se, decerto, que você sabe quando ama quando você sabe que ama.
E o saber depende da sua vivência, da bagagem acumulada, porque, tão certo quanto o raiar do sol num novo dia, a conclusão será outra uma vez talhada a experiência em decepções, alegrias e conhecimento.
Num estalo, lembrei do Freddy Mercury. Na eureca da montagem da compreensão, o sarcasmo, embora presente, era secundário na poesia do verso que apelava ao ineditismo do amor.
Sempre que nos apaixonamos, é como se o fizéssemos pela primeira vez. E senti-lo real é fazê-lo real.
Sou, enfim, livre.
Artigo publicado originalmente na Papo de Galo_ revista #2.
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