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Baêa, luz, lampião e estrela

Baêa, luz, lampião e estrela

O relógio ainda apontava faltar muito tempo para o primeiro toque da final da Copa do Nordeste, mas o destino estava fadado. As ruas no entorno da Fonte Nova já se pintavam de vermelho, branco e azul. O ônibus da delegação já chegou carregado nos braços do povo, que em uma só voz, entoava em êxtase “Bora, Baêa!”

Os astros se alinhavam, tiravam uma folga nas suas rotas elípticas, senhores do tempo, que parecia parar. Os carpinteiros do universo, embasbacados com a algazarra que se fazia na velha cidade da Bahia, pausaram para um café e miravam atentos e apaixonados com as mãos apoiando o queixo, boquiabertos.

Num transe, já assimilavam o frenesi, e repetiam em coro: “Êa! Baêa!”

Na Fonte, o volume aumentava, até ensurdecedor. Gente do lado de fora querendo entrar, mas não podendo; gente do lado de dentro querendo gritar e não se contendo.

Cada novo giro de ponteiro era um trabalho de catequização. Na antessala da espera, convertiam-se, um a um, de todas as crenças, que se reuniam numa grande confraternização em homenagem aos deuses da bola.

Em todos, no terreno e no divino, instalava-se a confiança, a certeza. Não havia solução: era Bahia campeão. Sem nem bola rolar. Estava escrito nas estrelas.

E quem tem estrela entende de luz. Ora, pois, pois.

Os refletores da Nova Fonte se apagaram, para que a galáxia se formasse nas arquibancadas. Espelho do universo de se fazer Bahia. Cada flash de celular era um astro que lhe emprestava, sorrindo, o protagonismo. Quem do longe acompanhava, se Bahia não fosse, Bahia seria. Como não?

Para que, na entrada do time, o astro-rei brilhasse.

As estrelas sobre o escudo do esquadrão de aço eram como holofotes, exalando força, poder. Eram como sol que cegavam seus oponentes.

No cumprimento ao visitante, a submissão se fazia. A entrega do oponente ao supremo, sem pestanejar. Não havia como lutar. As estrelas de bi-nacional hipnotizavam. Paralisavam. Diziam:

“Se ligue, mô pai. Aqui é Baêa. Nem venha.”

Não deu nem para dar graça ao baba.

Deu Bahia, deu o que tinha que dar. Não tinha jeito que desse jeito. Com requintes de maravilhamento, para delírio de convertidos e iniciados, porque é falácia que sofrido é mais gostoso. Não, minha gente, com festa garantida é muito mais.

Na rivalidade soteropolitana, abriram mão do próprio curral, distribuindo migalhas, para buscar o feito do domínio do Nordeste. A carinhosamente chamada Lampions League, que, em farra, ficou anos-luz à frente da irmã menor europeia. Nada houve de maior na noite de quarta-feira, quando Salvador tomou para si a pecha de Cidade Luz. Foi mal aí, Paris.

E se Lampions é, Lampião agora brilha ainda mais fortemente potencializado pela magnitude de um Bahia forte, sabedor de que pode mais e com olhos ambiciosos de quem quer mais.

Bahia que verá suas estrelas brilharem, orgulhosas e briosas, pois seu manto é honrado e idolatrado. Pulsarão na velocidade de um piscar de olhos, na batida do coração da multidão.

Num drible de Edigar Junio.

Numa triangulação de Allione e Régis.

Numa defesa de Jean.

Numa cabeçada fatal de Tiago.

No escrete que ninguém vence em vibração, de cabeça erguida, na grandeza que lhe cabe.

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Artigo publicado em 25 de maio de 2017 no Correio da Bahia. Link aqui.

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