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Emboscada

Emboscada

Eram 4 horas da manhã quando o telefone do Roberto começou a tocar. Acordou de supetão, assustado com o alto barulho do celular e com o muito tarde da hora. Na tela, via que sua mãe chamava. Boa coisa não poderia ser.
 
– Oi, mãe, está tudo bem?
– Filho… ela soluçava de chorar.
– O que foi, minha mãe?
– Meu filho, vem pra casa agora. Aconteceu uma tragédia! E caía num choro desesperado.
 
O pai do Roberto tinha falecido já há alguns anos, e a mãe morava no mesmo sobrado sozinha. Todos os filhos já tinham saído de casa, Roberto era o mais velho, já casado, filho pequeno e vida encaminhada.
 
– Está tudo bem? Me fala alguma coisa!
 
Nisso ele já tinha dado um pulo da cama, estava colocando a roupa para sair correndo. Sua esposa, que acordou também assustada, pergunta o que está acontecendo.
 
– Não sei, mas coisa boa não é. Minha mãe está chorando aqui no telefone, e…
– Eu me machuquei meu filho! Vem logo, o que você está esperando?
– Estou saindo de casa agora.
 
Deu um beijo apressado na mulher, e seguiu rumo para a casa de sua aflita mãe. Chegando lá, abriu a porta com sua chave – cada filho tinha a sua – e danou-se a gritar pela mãe casa adentro. Ouviu ela responder estar no banheiro, subiu correndo as escadas em direção à suíte. Viu-a caída dentro do box do banheiro, sangue escorrendo pelo ralo, feição de dor inigualável.
 
– Onde dói? Perguntou ele procurando saber se poderia, ou não, carregá-la.
– Meu braço esquerdo, meu filho. Acho que está quebrado. Eu entrei no banheiro para tomar um banho, era tarde, morria de calor! Esse fogacho que não me deixa em paz! Eu escorreguei, virei o pé, caí com o cotovelo na parede… Ai!, que dor!
 
E gritava. Pobre Dona Vera.
 
Tomando cuidado para não causar maiores problemas, Roberto entregou uma toalha à senhora para lhe cobrisse parte do corpo. Conseguiu levá-la até o quarto, onde arrumou uma calça larga e uma camiseta sem manga, desceu escada abaixo servindo de apoio ao braço bom enquanto ela pulava num pé só.
 
Abriu a porta do carro, com mais cuidado ainda, sentou-a no banco do passageiro, travou o cinto de segurança. Por um segundo, deu um beijo na testa da acidentada.
 
– Vai ficar tudo bem.
 
Dia estava prestes a amanhecer quando chegaram ao hospital. Preenchidos os formulários – apesar da dor que sentia, caso não era grave – foi encaminhada para fazer um raio-x. Nele, a constatação do pulso esquerdo quebrado, uma forte inflamação no cotovelo esquerdo com um corte profundo por onde o sangue se esvaia e o pé direito torcido.
 
Começaram a providenciar o conserto da Dona Vera. Uma tala para imobilizar o pulso. Depois, um anestésico local no cotovelo, pontos para fechar a fenda. Em seguida, chegou um enfermeiro para fazer o molde do gesso que travaria por completo o pulso esquerdo. A bota ortopédica chegou que ninguém tinha visto, e já se encontrava no pé.
 
Eram quase 8 horas quando todos os requisitos foram cumpridos. O médico, no entanto, por precaução, pediu para que ficassem em observação por, pelo menos, 12 horas. Poderia haver alguma hemorragia interna.
 
Ligou para a esposa, que, extremamente compreensiva, disse que não se preocupasse, que estava tudo bem, que ela tomava conta. Almoçou no quarto com a mãe, a tarde passou arrastada, até que por volta das 18 horas, mais uma série de exames. Pouco menos de uma hora depois, voltaram para o quarto a mãe e o médico.
 
– Creio que ela pode ir para casa, Roberto. Ela está ótima, dentro do possível, claro.
– Que bom, doutor.
– Vou agilizar a papelada, creio que em mais ou menos meia hora vocês poderão ir para casa.
– Obrigado.
 
Ambos aliviados.
 
Às 20 horas saíram. Levou-a para sua casa. Tinha um quarto a mais, e, claro, já havia avisado sua mulher de que seria necessário. Não poderia ficar em casa sozinha naquele estado, até cadeira de rodas teve que alugar.
 
Dali a mais um tempo chegou à sua casa. Estranhou estar tudo escuro, sua esposa sabia que estava chegando. Devia ter saído ao mercado para completar a despensa.
 
Rodou a chave e a maçaneta, para ser recebido por cerca de três dezenas de pessoas na sua sala, luzes acendidas, e um grito uníssono.
 
– Surpresaaaaaa!
 
Ele nada entendia! Como assim?
 
Tinha esquecido que era seu aniversário. Não estava muito em clima de celebração.
 
Sentiu um leve toque em suas costas. Era sua mãe, que ria da cara do filho. Chamou-o com a mão livre. Ele foi chegando, até que ela o puxou num abraço carinhoso e apertado.
 
– Como você sempre queria, mas nunca caía… Finalmente, te peguei numa festa surpresa! Parabéns, meu filho, feliz aniversário.
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