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Na minha matemática, Senegal

Na minha matemática, Senegal

futebol, Senegal, Grupo H, Copa do Mundo, Rússia 2018, fair play, Japão, Colômbia, Polônia

Como se mede carisma? Como se mede simpatia? Tivesse eu que criar um indicador, partiria para o ISLOQ: Índice de Sei Lá O Quê. Aquele que se calcula na base do achismo, do sentimento, da vontade de abraçar. Sabe como é? Não tem fórmula fixa, use como o quiser, na mais perfeita implantação do MSLC, o Modo Sei Lá Como.

Em se tratando de je ne sais quois, a seleção de Senegal tinha para dar e vender. Mas ‘jenesseqüá’ não se vende. Sequer se sabe o que é, afinal. Então a distribuição era gratuita, em ação o que elevava ainda mais o valor do produto, que não era produto, que não tinha valor de face, a não ser o valor de até onde sobe na sua barra do ISLOQ.

A nova e vanguardista métrica envolve futebol aberto, junta dança no aquecimento, engloba sorrisos, adiciona colorido, considera torcida, roupas, cantos, brilho no olho. E mais um monte de coisa que eu nem faço ideia, porque subjetividade não aceita apontamento.

Na comparação de ISLOQ entre as seleções, está cristalino. Se a Copa do Mundo fosse decidida em carisma, não haveria dúvida. O favorito disparado, campeão incontestável, seria Senegal. Tudo bem, o contexto colaborava. A gélida e pálida Polônia, cabeça-de-chave sofrível, alimentava o desejo de que os outros do grupo avançassem.

E houve concorrência forte. Afinal, o que dizer desta Colômbia, nossos vizinhos sulamericanos com jogadores e laços estreitos com o Brasil? Como não se encantar com a dança caótica e espasmática de Mina, que se tivesse dormido no colchão de Marcelo ganharia três hérnias de disco e ficaria sem mexer por uns quatro meses? Foram para cima, sem James Rodriguez, amarelinhos como bate o coração brasileiro. E como não gostar deste Japão que buscou resultados empinando o nariz, abusado que só, vestido de azul como a cor do mar que envolve a ilha?

O dilema estava montado na frieza do só-passam-dois: um deles estaria fora. E a última rodada começou com os empates classificando o Japão em primeiro e Senegal em segundo. Os cafeteros davam adeus à competição, mas tudo poderia mudar com apenas um gol. E ele veio.

A Polônia, a insossa europeia, estilingou o Japão, porque podia, porque sim, porque tinha um resquício de honra a fazer vez. Pronto, mudou tudo. Agora Senegal passava em primeiro, Colômbia em segundo, Japão fora. Mas tudo poderia mudar com apenas um gol. E ele veio.

Mina subiu mais alto que a zaga verde e pôs a Colômbia na frente, porque podia, porque devia, porque depender dos outros é erro estratégico. Fizeram onda na comemoração – conta muitos pontos no ISLOQ –, seguraram o ímpeto senegalês. Só que embaralhou o grupo e ao extremo. Agora, Colômbia era líder, Japão e Senegal empatados em segundo. Mesmo saldo, mesmo número de gols, confronto direto empatado. A classificação dum ou doutro seria decidida no número de cartões amarelos. Ora, inédito!, fair play como fiel da balança. E os asiáticos, mais disciplinados, prevaleceram.

Só que no meu ISLOQ particular, o Japão despencou quando abdicou de jogar bola no fim do jogo contra a Polônia. Modorrentos, saíram justamente vaiados, com o advento do regulamento debaixo do braço. E já que a arbitrariedade opinativa é a tônica do mundo das redes sociais, levanto motim contra essa tecnicidade que de futebol nada entende, porque fria em números e vazia em alma. Fair Play, não! Institua-se, já!, o ISLOQ como critério de classificação. Porque na minha matemática, deu Senegal na cabeça.

* Gabriel Galo é escritor.

Crônica publicada hoje no site do Correio da Bahia. Link AQUI!

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