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Como se faz uma coligação política?

Como se faz uma coligação política?

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INTRODUÇÃO

O dilema é o mesmo em cada eleição. De repente, para surpresa de alguns, espanto de outros e resignação de tantos, um partido se alia com outro que até pouco tempo era seu rival. Um adversário político rasga sua história para apertar a mão de outro. E assim, no vai-e-vem das alianças, traça-se o destino do país.

Afinal, quais são os pontos que levam a uma construção de coligações políticas?

Nesta linha, há uma premissa importante, fundamental, elementar, para entender o poder constituído: não há espaço para ideologia. Relembrando 10 lições básicas para se compreender política:

  1. Políticos não lutam contra a corrupção em linhas gerais. Políticos lutam contra a corrupção da qual eles não fazem parte.
  2. Nunca seja mais fraco politicamente que a sua base aliada.
  3. Influência política se constrói com a quantidade de rabos presos que um político consegue amealhar.
  4. Não existe governo sem o MDB.
  5. Nenhuma fala de político deve ser lida literalmente, senão nas entrelinhas.
  6. O aliado de hoje pode ser o adversário de amanhã. E vice-versa. E de novo. Em loop.
  7. Não existe uma má aliança partidária se ela for capaz de levar votos, dinheiro e tempo de televisão.
  8. Saber falar bem na TV é mais importante que currículo e boas propostas.
  9. Discursos inflamados e de soluções simples invariavelmente resultam em governos tenebrosos.
  10. O real poder nacional está no Congresso.

A partir destes conceitos, neste artigo falarei de 6 pontos que são os fundamentais para que as teias partidárias se formem. Eles já foram previamente listados no artigo Quanto vale uma coligação nas eleições 2018, e agora são debatidos mais a fundo.

É importante ressaltar que a equalização da decisão na formação de uma coligação parte de uma análise equilibrada de todos os pontos aqui colocados, inclusive avaliando-se o movimento dos adversários. É a implantação de conceitos da Teoria dos Jogos, mas com um manual de uso.

Esta configuração é aplicável também para eleições municipais, observando-se algumas adaptações dos indicadores. Tempo, por exemplo, remete apenas a cidades com propaganda política na televisão. Já o palanque deixa de ser estadual e passa a ser analisado de acordo com os bairros a que um candidato poderá ter acesso.

A utilização da metodologia aqui exposta tem também como premissa saber avaliar política fora do âmbito das paixões ideológicas.

Por fim, vamos falar de alguns casos práticos para aclarar a percepção com a prática. Os 6 conceitos aqui colocados serão avaliados conforme modelo de risco, espelhando a corrida presidencial das Eleições 2018 para os principais candidatos: Alvaro Dias (Podemos), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB), Jair Bolsonaro (PSL), João Amoedo (Novo), Lula/Haddad (PT) e Marina Silva (Rede).

Não foram avaliadas as candidaturas de Cabo Daciolo (Patriota), João Goulart Filho (PPL), José Maria Eymael (DC) e Vera Lúcia (PSTU).

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6 PILARES DECISORES DE COLIGAÇÃO POLÍTICA

1

Potencial de votos

Este é o item mais importante na formação de uma coligação. Quanto mais votos uma determinada legenda tiver, mais relevante ela será e, consequentemente, maior será seu poder de barganha. Este potencial de votos se percebe não somente na esfera federal, mas também no executivo estadual e no Legislativo. Trata-se, portanto, de uma cadeia integrada de votos, um “pacote completo”.

2

Tempo adicionado para propaganda (e proporcional fundo partidário)

É um item tratado diretamente por lei. O tempo de propaganda eleitoral e inserções durante as programações de rádio e TV é calculado automaticamente. Assim, na largada, cada partido tem um ativo importante para ser levado em consideração. Este é um forte poder de barganha daqueles que têm mais tempo, o que implica em consequente maior bocada do Fundo Partidário e de eleitos no Congresso. Tempo de TV é, portanto, quantidade de aliados. É onde, por exemplo, o MDB deposita suas fichas.

Não duvide: propaganda DECIDE eleições.

3

Custo de entrega

Ao mesmo tempo em que o MDB capitaliza em cima de tempo adicionado e proporcional base aliada, o custo de entrega é alto demais – vide caso Dilma Rousseff. A questão aqui é o quanto cada candidato tem que “entregar” de poder à sua base aliada para que ela se una a ele. O item 2 das 10 lições básicas para se compreender política afirma: “nunca seja mais fraco politicamente que a sua base aliada”. Este ponto derruba a cotação da atratividade de muitos candidatos. É o “preço” a ser cobrado pela aliança, por vezes difícil de ser mensurado.

4

Alinhamento ideológico

Este item está cada vez mais em desuso. Afinal, somente partidos recém-criados podem levantar a bandeira do alinhamento ideológico imaculado, ou então partidos mais ao extremo do espectro político e, por isso, irrelevantes politicamente. Assim, quanto mais ao Centro ou quanto mais antigo, mais difícil é separar quem do quê. É tudo uma coisa só.

Ainda assim, na maioria dos casos, há pelo menos uma linha que não pode ser cruzada – exceção ao MDB, por óbvio. A amplitude do que se encaixa em sua linha entendimento de ideologia é que determina maior ou menor propensão a abraçar outras siglas. Não é, portanto, julgamento de valor das premissas ideológicas, mas sim qual a possibilidade de atrair outros partidos para dentro de suas trincheiras.

5

Risco de imagem

Trata-se do risco de um candidato provocar saias justas e momentos constrangedores, além de destruir pontes e conexões políticas existentes. Peguemos como explicação a forma como as empresas decidem contratos de patrocínio. Elas avaliam não somente o retorno potencial, como também o risco envolvido à sua marca. A regra para este item em política é similar. Diz, portanto, da probabilidade de haver problemas de imagem provocados por um candidato ou candidata, como racismo, gafes ou demonstrações inequívocas de ignorância.

6

Qualidade do palanque estadual

As primeiras notícias das coligações formadas para estas Eleições 2018 deram conta de inúmeros entraves estaduais complicados. Com mais destaque, Pernambuco e Minas Gerais sofreram baques significativos, com candidatos se declarando abertamente contra as convenções nacionais. No estado nordestino, criou-se um bifurcação possivelmente irremediável. O MDB tem 2 nomes como candidatos ao Senado (que oferece duas vagas este ano), sendo que cada um está alinhado politicamente a candidaturas diferentes, e, absurdo!, NENHUM prestou apoio a Meirelles.

O apoio estadual garante visibilidade a candidatos que não possuem entrada em uma determinada região. É o que faz o PSDB ter dificuldades históricas no Nordeste, por exemplo.

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COMO ESTES PILARES DECISORES IMPACTAM CADA CAMPANHA?

Álvaro Dias (Podemos)
Coligação Podemos, PSC, PRP, PTC

Álvaro Dias, não à toa, construiu a segunda maior coligação em número de partidos, 4. Só que o problema de Alvaro Dias é seu potencial de votos e tempo de TV. Sua abrangência é meramente regional. No Sul do Brasil, ele possui um peso significativo; fora do Sul, é um elemento desconhecido. Esta questão se faz presente mesmo com a imagem sem arranhões por acusações mais graves em sua história política. O problema é que ele concorre no mesmo terreno de Geraldo Alckmin. Briga com os mesmos argumentos. E no fim, no peso da atratividade de suas propostas de parceria, entre um e outro, melhor se aninhar com o PSDB e uma chance real de eleição.

Ciro Gomes (PDT)
Coligação PDT, Avante

O personalismo de Ciro Gomes complica as relações de poder na hora de tecer alianças políticas. Por mais que um potencial razoável de votos, um tempo não insignificante de propaganda, alguns palanques regionais relevantes e uma capacidade de negociação – e de ver política – fora da curva, Ciro se perde quando monta sua ideologia. Qual seja: a que ELE definir. As linhas de entendimento de Ciro são absolutamente imutáveis. Aliar-se a ele significa seguir suas ordens e visões sem questionamento. Além disso, Ciro tem temperamento explosivo. Nunca se sabe quando ele provocará um constrangimento aos seus aliados. Seu pavio curto pode explodir um barril de pólvora. Sua capacidade de articulação, no entanto, é louvável.

Geraldo Alckmin (PSDB)
Coligação PSDB, PP, PTB, PSD, SD, PRB, DEM, PPS, PR

Por esta ótica, percebe-se por que Geraldo Alckmin conseguiu amealhar tantos partidos em sua base aliada. É importante verificar como a ausência de itens impeditivos, que geram ruído definitivo. Se por um lado ele não empolga – sob nenhum espectro – Alckmin é o representante da estabilidade dentro do famoso “Centrão”. Leva uma quantidade relevante de votos (está longe do piso de sua candidatura), carrega um bom tempo de TV e balanceia os outros itens sem dar muita pinta. Está disposto a abrir mão de parte do poder para atrair coligados (mas sem pagar o preço inicial pedido pelo MDB). Sua ideologia parece ser simples: nada aos extremos. De resto, pode chegar que eles aceitam! Em imagem, luta para distanciar-se das implicações com as Máfias da Merenda e da Dersa, e parece sempre sair incólume das inúmeras acusações de corrupção em seus mandatos. Tem excelentes palanques em Sul, Sudeste e Centro-Oeste, mas patina, como sempre em Norte e Nordeste.

Guilherme Boulos (PSOL)
Coligação PSOL, PCB

Boulos poderia, facilmente, entrar na lista de candidatos que não deveriam ser avaliados. Os riscos envolvidos na construção de coligação indicam por quê. Não possui votação expressiva, nem tempo de TV, nem está disposto a abrir mão de poder do partido. Além do mais, todos parecem estar à direita do PSOL (exceto, talvez, o PSTU e outros partidos de causas operárias e afins). Em esforço hercúleo, tem conseguido reparar sua imagem de extremista do MST para um candidato centrado e que sabe debater. Tudo indica que ficará às margens da campanha em primeiro turno.

Concomitantemente, o PSOL possui um time de candidatos ao Legislativo que é eclético e poderoso. A batalha de Boulos é menos pela presidência e mais pelo avanço do partido no Legislativo, em ação similar ao que busca João Amoedo (ver abaixo).

Henrique Meirelles (MDB)
Coligação MDB, PHS

Meirelles seria o candidato ideal do dito “Mercado”, não fosse o fator severo do item “Entrega”. O preço cobrado pelo MDB é altíssimo. Apesar de levar votos no âmbito estadual (irrelevante no federal), ter uma ideologia abrangente (aceita-se aliança com qualquer um, desde que governo) e com palanques espalhados pelo país inteiro (é o partido com maior número de prefeitos), Meirelles luta com uma imagem arranhadíssima do partido como um todo (embora seu próprio nome não crie tanta rejeição direta).

O MDB ainda não encontrou seu fator de equilíbrio para entrar em qualquer candidatura. Certamente, no segundo turno, esperará para ver quem terá mais chances, e declarará apoio ao provável vencedor. Depois, nos bastidores, discutirá o preço de seu embarque na base aliada, como sempre fez. Importante lembrar: não existe governo sem o MDB.

Jair Bolsonaro (PSL)
Coligação PSL, PRTB

Por esta análise, não é difícil enxergar por que Jair Bolsonaro parte sozinho nesta campanha, apesar de sua mais do que expressiva carga de votos para Presidente. O partido não leva tempo de TV, pelo contrário, terá um dos menores espaços na propaganda oficial. Ao mesmo tempo em que está disposto a abrir mão de poder para que outros partidos se unam ao ex-Capitão, outros fatores são ferozmente impeditivos. Primeiro no aspecto ideológico: tudo está à esquerda de Bolsonaro. Aliar-se a ele significa abrir mão de racionalidade, espelhada na massa de apoiadores cegos que foi capaz de alistar. O que leva uma extrapolação do item “Imagem”. O risco de dano é tão significativo que ninguém relevante do mundo político “cola” no candidato. Também, mesmo com tanto voto, o partido de Bolsonaro não tem palanques estaduais que justifiquem alianças regionais.

Há tanto risco envolvido que não é surpresa que permaneça isolado durante toda a campanha, mesmo num eventual segundo turno.

João Amoedo (Novo)
Sem coligação

Amoedo paga o preço de ser um partido recém-criado. Não tem votos, não tem tempo de propaganda, não tem palanque construído. Se vê num labirinto sem saída por conta de sua ideologia: fora de sua bolha, tudo é estatismo, além de não se aliar a quaisquer partidos por conta de se posicionar como o “não político”.

Este papel não é necessariamente ruim para o Novo. Pelo contrário. A atuação de Amoedo nestas eleições não tem como objetivo os Executivos, sejam eles Estaduais ou Federal. Ele é o General se sacrificando pela sua tropa que tenta garantir cadeiras em Assembleias e Congresso.  É no crescimento dentro do poder Legislativo que reside o contínuo crescimento de relevância do Partido Novo. E eles estão certíssimos estrategicamente (vide as 10 lições básicas sobre política).

Lula (PT)
Coligação PT, Pros, PCdoB

Sim, Lula tem muitos votos. Sim, o PT ainda terá muito tempo de TV. Mas os itens “Entrega” e “Imagem” pesam demais para o isolamento do partido. É a menor coligação da sigla em quantidade de partidos desde 1989. Primeiro que o PT não está disposto a abrir mão de nem um pedaço de seu protagonismo político na constituição de planos de governo. Sabe que vai sem Lula, e não pode repetir o erro cometido com Dilma e o MDB. Ao mesmo tempo, o partido está dilacerado em esquemas de corrupção, com imagem destruída fora do seu círculo de militância. Ideologicamente já provou que aceita quase tudo – exceto extremos à direita e ainda consegue reunir bons palanques em estados-chave.

Marina Silva (Rede)
Coligação Rede, PV

Marina teve votações expressivas nas Eleições de 2010 e 2014. Ainda assim, não cresceu de um ano para o outro e foi duramente atacada por sua postura “fraca” em todos os momentos. Paga, assim como Amoedo, o preço de ser um partido que acabou de nascer. Sem tempo de TV nem uma base parlamentar forte, vai somente com seu nome para o pleito. Tenta de todas as formas se desvencilhar da fragilidade percebida pelo eleitorado e da história no PT – incluindo o apoio a Aécio no segundo turno em 2014. Ter conseguido levar Eduardo Jorge (PV) para vice – ela mesma ex-filiada ao partido – foi uma vitória parcial em sua luta por destaque.

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